US$ 8.018.238.636.164. Esse é o preço de todo ouro disponível no mundo. Como vocês podem ver, ele é mensurado na casa dos trilhões. E para que se usa o ouro? Na verdade, não para tanta coisa que o preço sugere. Ouro pode ser usado para adereços – joias –, por exemplo. Entretanto, muitas coisas também ornamentam, inclusive capim dourado, muito mais barato e que cai bem em muita gente. Há usos na indústria eletrônica e na indústria aeroespacial, mas essa demanda não é suficiente para explicar o preço. Há usos em medicamentos para artrose, novamente incapazes de justificar tamanha capitalização de mercado.
O principal motivo para essa valorização toda é histórico: o ouro é escasso e acabou sendo um metal confortável para fazer moedas; foi a base de um padrão monetário que durou bastante tempo. Ainda hoje as pessoas guardam sua reputação como reserva de valor. Quando vêm e vão crises, o ouro se faz necessário para guardar valor. Isso, no entanto, não é exclusividade sua. Essa característica se faz presente também obras de arte, por exemplo.
Aonde quero chegar com isso? O ouro não é o único ativo a ser reserva de valor, porém seu valor dá uma margem de quanto uma reserva crível pode chegar. Dito isso, muitos dizem que o ouro é uma bolha pelo descolamento de seu valor fundamental em relação ao seu valor de mercado. Desde a década de 80, economistas profissionais – dentre eles Olivier Blanchard, economista-chefe do FMI – discutem se o ouro é uma bolha ou não. Dentre as evidências – em geral sem resposta conclusiva –, a mais recente e interessante indica que o ouro não é uma bolha se consideramos seu valor fundamental de reter valor frente a crises econômicas.
O Bitcoin foi estudado recentemente como um ativo capaz de ter propriedades de hedge de outros ativos normalmente encontrados (veja este estudo e este). Isso já mostra que ele age, de certa forma, como o ouro. Inclusive, alguns pesquisadores testaram para alguns dados passados – pós-Mt. Gox, por exemplo – e encontraram bolhas, como no tradicional ativo metálico. Entretanto, vale notar que há debate sobre sua capacidade de reagir a variáveis macroeconômicas e financeiras, sendo o hedge por meio dele algo limitado aos contextos normalmente explicativos do ouro. Numa outra veia, alguns analistas falam que o valor do Bitcoin está na lei de Metcalfe, que relacionaria preço a número de usuários. Uma análise mais atenta da relação causal entre as variáveis mostra que talvez não seja bem assim, sugerindo errada a ideia de que é o valor como meio de pagamento que justifica majoritariamente o preço.
Com tudo isso, parece ser o caso do Bitcoin estar crescendo majoritariamente por sua capacidade de ser uma reserva de valor. Há fragilidades de correntes disso, como a volatilidade que tiraria a garantia dos investidores. Usando o método econométrico Exponential GARCH para modelar sua volatilidade a partir de dados diários da Bitfinex – corretora relativamente líquida e com dados confiáveis – podemos ver que a perda mínima que aconteceria uma a cada 100 vezes – dado pela série em vermelho – está em alta em 2018. Conclui-se desse estudo que não é uma época fácil para os investidores.
Contudo, o valor de mercado do ouro é uma boa lembrança. Há espaço para quem quer ser reserva de valor. Além do mais, a volatilidade tende a se reduzir conforme o mercado for se consolidando por novos produtos por vir. Por exemplo, com mais fácil acesso a futuros de criptoativos, investidores e intermediários financeiros podem criar produtos mais estruturados que reduzam os danos de choques. Particularmente, não vejo muitos motivos financeiros para ser pessimista com moedas a longo prazo. As criptomoedas continuam arriscadas e uma posição sensata depende de quanto tempo e da capacidade de segurar o investimento, mas acredito que quem é de HODL deva segurar, quem é de trade, deve continuar na sua estratégia. O argumento de que “é uma bolha e vai estourar” não é tão fácil assim.