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O Elefante na Sala

Publicado 24.06.2019, 10:40
Atualizado 09.07.2023, 07:32

Com que roupa eu vou? Sento-me de costas para a Faria Lima. Poderia ser uma boa metáfora; ou é mera coincidência, sei lá. Visto camiseta e calça jeans. Atrás de mim, dez andares abaixo, caminham homens de terno. Pior ainda: transitam em bicicletas amarelas e patinetes verdes. O social completo não me parece combinar com a modernidade do transporte. Isso importa menos. Os ternos estão vazios ou são de flanela cinza. O inimigo mora ao lado.

Os ternos vazios já são expressão conhecida dos três leitores desta newsletter. Os flanelados de cinza ainda não.

Ternos vazios representam uma metáfora, é claro. Pessoas que se vestem de teorias sofisticadas para parecerem entendidas. Montam apresentações cheias de números — mesmo sem saber o que eles significam — e tentam convencer os outros de sua sofisticação. Munidos dessa técnica de retórica e percebidos como superiores, acabam vendendo sua ideia — ou um produto financeiro qualquer, normalmente caro.

Os homens no terno de flanela cinza são outra coisa. Aqui faço referência ao best-seller homônimo de Sloan Wilson. As pessoas acabam se acostumando, sem perceber, às várias pressões que vão lhes sendo impostas. A família, as necessidades dos filhos, as imposições mundanas, os desejos corporativos. De repente, a vida é apenas a manifestação da vontade do outro, e nós vamos nos afastando da gente mesmo, oprimidos por um sistema sufocante. O processo acontece com especial maquiavelismo, quase de maneira dissimulada, pois parece que é tudo tão natural, mas vai nos corroendo aos poucos, fingindo normalidade em meio à destruição pessoal. Acabamos aceitando tudo aquilo, meio sem perceber, e as vontades alheias vão se manifestando na gente mesmo. A imagem de um homem no terno de flanela cinza, acomodado e sem forças para lutar contra aquela exuberância de um sistema impenetrável e insuperável. Acabamos como escravos dos outros, seres servis com sua liberdade cerceada.

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A ideia foi desenvolvida melhor pela filósofa Hannah Arendt na obra “Eichmann em Jerusalém”, em referência ao julgamento de Adolf Eichmann, um dos principais organizadores do Holocausto. Arendt descreve Eichmann como o exemplo supremo do terno de flanela cinza, um sujeito que perdeu toda responsabilidade e individualidade humana. Diante de respostas absolutamente inexpressivas de Eichmann, Arendt viu ali uma importante manifestação de conformismo vazio. Segundo ela, Eichmann não possuía traços ou histórico antissemitas, não parecia doentio ou de caráter distorcido. Teria agido apenas conforme aquilo que acreditava ser o seu dever, cumprindo ordens superiores e tentando ascender profissionalmente, alinhado com perfeição à lógica burocrática.

O mal se instala diante desse vazio de pensamento e reflexão. Não vem da natureza, tampouco é metafísico. Trata-se de algo histórico e político, acontecendo onde existe espaço institucional para isso. A multidão fica incapaz de fazer julgamentos morais, éticos e racionais, cumprindo ordens e convenções sem questionar. Aí surge a banalidade do mal, que vai penetrando entre nós sem que questionemos ou nos rebelemos contra aquilo.

“Eichmann em Jerusalém” despertou várias interpretações e motivou uma série de estudos na disposição das pessoas apenas obedeceram a ordens de forma não criteriosa ou mesmo de atenderem a certos padrões e convenções sem qualquer questionamento. Os pesquisadores Stanley Milgram e Philip Zimbardo, por exemplo, desenvolveram técnicas para medir até que ponto as pessoas seriam obedientes. Seus resultados foram impactantes. Descobriram que quase todos estariam dispostos a infligir torturas se as ordens para tanto partissem de uma figura com reconhecida autoridade.

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As ordens e as convenções têm sobre a gente mais influência do que percebemos. Adotamos as coisas que nos chegam como verdade em vez de questionar crítica e ceticamente se aquilo realmente faz sentido. Pode ser uma atrocidade — se veio de alguma autoridade, pronto! “Ah, mas deu no jornal!” E daí, sabe? “Ora, mas este especialista não gosta deste ativo.” Sim, mas outro especialista gosta.

Sabe, o Ibovespa está em recorde histórico. Os juros de mercado estão nas mínimas. E eu estou aqui discutindo detalhes tão pequenos, disfarçando os erros do meu português ruim. Perdidos em filigranas absolutamente pontuais, esquecemos de discutir o que realmente importa, sabe? Enquanto isso, o mal segue enraizado nos investimentos das pessoas. Como sempre foi assim, parece que está tudo bem, como se tudo fosse frívolo e banal.

Por mais que eu fale aqui para você comprar Alupar (SA:ALUP11) em vez de Taesa (SA:TAEE11), CPFL (SA:CPFE3) após a oferta em vez de qualquer outra empresa de energia integrada, RLOG em vez de RAIL, Itaú (SA:ITUB4) em vez de Bradesco (SA:BBDC4), Sanepar (SA:SAPR11) em vez de Sabesp (SA:SBSP3), a verdade é que tudo isso chega a ser idiota.

Cara, de acordo com matéria do G1 da semana passada, 65 por cento das pessoas que guardam dinheiro escolhem a poupança como destino da sua grana. E a segunda forma mais popular de poupar é deixando dinheiro em casa (alternativa citada por 25 por cento das pessoas). Essa estrutura precisa ser quebrada. E quando falo estrutura é porque está mesmo na base da sociedade brasileira. O resto é detalhe. Ficamos debruçados sobre pequenas poeiras no canto dos quartos enquanto há um elefante sentado no meio da nossa sala.

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Precisa ser trazida à mesa a discussão sobre asset allocation, ou seja, sobre a gestão de portfólio como um todo. Algo que não ocorre mesmo quando se ataca a poupança como uma alternativa ruim para seu dinheiro. Pode reparar. Quando se fala de opções para sair da caderneta, aparecem os fundos DI, o Tesouro Selic, algum CDB, no máximo uma debênture incentivada. Mas quem trata da gestão do portfólio, que é o que interessa?

Sim, sim, eu acho que você pode e deve sair da poupança e migrar para o fundo DI do BTG Pactual (SA:BPAC11) Digital, da Órama ou da Pi. Mas você já fez a conta? Não é isso que vai mudar sua vida, sabe?

Não precisa ir muito longe. Matéria de hoje no Valor fala do quanto o investidor ainda se depara com fundos de renda fixa muito caros — há, segundo a reportagem, mais de 56 bilhões de reais em fundos de renda fixa indexados ao CDI que são caros e pouco rentáveis. Ótimo, vamos combater isso. Se você está num fundo DI que ainda cobra taxa, você está perdendo dinheiro. Ponto-final. Migre para um dos três acima.

Mas vamos lá.

Suponha que você aplique 10 mil reais em algo que rende, antes de taxas, 100 por cento do CDI. Admita juros estáveis no período. Então, você chegaria, depois de um ano, com 10.650,00 reais em termos brutos. Assuma que o negócio cobra 1 por cento de taxa anual. Assim, depois da taxa, você ficaria com 10.543,50 reais. Ao migrar para um fundo de taxa zero, você teria economizado 106,50 reais.

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Ok, legal, depois de um ano, você ganhou um almoço no Ráscal. Eu também gosto do Ráscal, mas não muda o jogo, sabe?

Só para ilustrar pontualmente a coisa, de forma bem grosseira, se você tivesse separado 1 mil reais e investido na Bolsa nos últimos 12 meses, sem a necessidade de ser um especialista em ações, comprando BOVV11 (SA:BOVV11) (a média das ações mais relevantes), teria obtido uma rentabilidade em torno de 45 por cento, ou seja, de 450 reais. São quatro almoços no Ráscal.

Não vale falar que o medo e as dificuldades operacionais impedem você de cuidar do seu portfólio como um todo de maneira mais inteligente. Aqui, você só colocou em risco 10 por cento do seu capital. Ou seja, não fez loucura alguma e ainda assim pôde apurar bons retornos.

Obviamente, retorno passado não paga conta de ninguém, nem serve de referência para o futuro. A questão aqui é que precisamos introduzir em qualquer tipo de conversa não apenas alternativas imediatas à poupança ou a fundos DI caros. Mas o conceito da necessidade de enraizar as finanças na vida das pessoas. Isso deve ser enfrentado mesmo por quem fornece informação, não apenas por quem recebe.

A verdade é que jornalistas não sabem de alocação de capital, agentes de banco não sabem de alocação de capital, agentes autônomos não sabem de alocação de capital, as fintechs descoladas que apresentam aplicações por robôs normalmente não sabem de alocação de capital (são excelentes em oferecer uma boa experiência do usuário, mas ninguém ali já trabalhou de verdade com gestão de dinheiro de terceiros).

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Aqui quero emprestar um termo adotado recentemente por André Esteves, que me parece preciso para descrever o processo que será visto nos próximos anos no Brasil, de forma muito rápida e avassaladora: “financial deepening”. Vamos observar um vertiginoso percurso na direção do aprofundamento dos investimentos no Brasil, uma espécie de irrestrita “financeirização”.

Veja o que aconteceu com o Goldman Sachs entre os anos 80 e 90. Ele se multiplicou por dez exatamente com esse pano de fundo macro, de financial deepening. Com uma economia estável e juros estruturalmente baixos, toda a indústria vai se enraizando e espraiando. Há uma multiplicidade de novos hedge funds, novos instrumentos para se aplicar, onda de IPOs, migração em direção a ativos mais sofisticados e arriscados, explosão do número de CPFs na Bolsa, ampliação do mercado de fundos imobiliários, exploração de uma ampla avenida em previdência privada.

Você precisa se preparar para este novo mundo, sem aceitar as convenções que estão sendo impostas. A banalidade do mal precisa ser combatida por você mesmo. Mais ninguém além de você pode insurgir contra esse comodismo e essa vassalagem. Comece a pensar o seu portfólio como um todo. Não apenas migre da poupança para um fundo DI mais barato ou de um DI para outro melhor. Olhe a carteira. Diversifique. Compre tudo que puder, nos mais variados mercados. Bolsa, dólar, fundos imobiliários, juro longo, criptomoedas.

O Ibovespa está em 102 mil pontos. Sim, parecia loucura 60 dias atrás. Agora, ficou óbvio. Tudo fica óbvio depois que acontece. O Fim do Brasil, os 10 Anos de Recessão, a Virada de Mão, o Segundo Mandato Temer, e por aí vai.

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O financial deepening está apenas começando. Próxima parada: 150 mil pontos.

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