A Volta dos Que Não Foram: o Filme do Risco Fiscal Que Ninguém Quer Ver

 | 25.07.2022 12:20

Há pouco menos de um ano, em 19 de agosto de 2021, escrevi neste mesmo espaço sobre o conceito de risco fiscal.

Em artigo intitulado “Risco Fiscal: um Fantasminha Nada Camarada na Vida de Gente como a Gente”, comparei as contas públicas com o orçamento de uma família que, quanto mais se endividasse, maiores juros teria que enfrentar. Afinal, quem emprestaria sem cobrar maiores retornos a uma família já atolada em dívidas, com o risco de nunca ver o dinheiro de volta?

Assim, concluí há um ano: podemos dizer que o risco fiscal é o risco envolvido nessa transação entre financiadores do governo e o governo. Desse modo, se investidores acham que o governo brasileiro é um bom pagador, o risco é menor. Do contrário, o risco é maior. E quanto maior o risco, mais descontados os ativos brasileiros: tipo nossa moeda, nossas ações, ou os próprios títulos do governo.

Cá estamos, quase um ano depois, e o fantasma camarada volta a nos assombrar.

A aprovação da PEC dos Benefícios Sociais/h2

Como tudo na economia, não há apenas um motivo por trás de movimentos como a piora do risco fiscal. E sim, uma combinação de fatores, que geralmente culmina na mudança de percepção de investidores após um evento visto como “a ponta do iceberg”.

Dessa vez, o bloco de gelo veio em forma da aprovação da PEC 123/2022 - mais conhecida como PEC dos Benefícios - aprovada no Congresso no acender das luzes do período eleitoral. A medida modificou partes da nossa Constituição para permitir o pagamento de maiores benefícios sociais até o fim do ano, como apoio a famílias e trabalhadores diante da alta acelerada da inflação, especialmente em alimentos e combustíveis.

O pacote incluiu, entre as principais medidas, o aumento em R$ 200 no valor do benefício e a expansão de famílias atendidas pelo programa Auxílio Brasil (a última medida aprovada como permanente), o aumento do auxílio gás, e a criação de um auxílio para caminhoneiros e taxistas. O custo de tudo? Pouco mais de R$ 40 bilhões.

Mas, se bens e serviços estão cada vez mais caros frente aos salários, famílias estão em dificuldade, e o governo está arrecadando mais do que o esperado com tributos: por que o alvoroço? Por que a alta do dólar, a queda da bolsa, os juros futuros subindo?

Em suma, por que a piora do risco fiscal, se as medidas parecem necessárias e capazes de caber no orçamento? A resposta rápida para essa pergunta é: porque não se trata do hoje. Se trata do amanhã.

A diferença entre a foto e o filme/h2

De fato, ao olharmos para o estado das contas públicas brasileiras hoje, a foto que nos deparamos é relativamente positiva. Com a arrecadação tributária robusta - puxada pelo alto preço de commodities, bons resultados de empresas com a normalização da economia e pela retomada do mercado de trabalho - o governo acumula resultado primário positivo até agora, no ano. Ou seja, estamos com as contas no azul!

Porém, a maré positiva deve durar pouco, não só porque as contas devem voltar para o vermelho com os gastos adicionais aprovados para o ano (que somam mais de R$ 100 bilhões, considerando também redução de impostos), mas especialmente pelos riscos criados e sinalizações dadas por essas mudanças em relação ao futuro.

A principal medida aprovada na PEC dos benefícios, a elevação dos benefícios ao Auxílio Brasil, se mantida no próximo ano, não caberá dentro do limite do teto de gastos – regra criada para limitar os gastos e estabilizar a dívida pública.

Isso porque, somado às despesas obrigatórias que totalizam mais de 90% do orçamento federal, como elevadas emendas parlamentares, ele acaba se tornando, novamente, a ponta do iceberg – independentemente de sua justificável existência.

Deste modo, assim como uma família que descolou uma renda extra por um curto período dificilmente conseguiria juros baixos para suas dívidas se sinalizasse que voltaria a além da conta, a sinalização de que o país caminha para uma nova era de gastos em alta, em detrimento da sustentabilidade das contas públicas, também tem consequências – como o próprio aumento dos juros que financiam a nossa dívida.

Para ilustrar, os juros reais de longo prazo no Brasil (determinados por investidores no mercado de renda fixa) encontram-se no patamar mais elevado dos últimos 7 anos. Isso não significa apenas mudanças para o mercado financeiro, e sim crédito mais caro para famílias ao redor do país, especialmente para planos de longo prazo como financiamentos imobiliários e de automóveis.

Ou seja, muito longe da foto positiva, o filme fiscal brasileiro hoje projeta crescentes riscos, observados à lupa por investidores, e precificados em nossos ativos.

Por fim, engana-se quem julga que o filme afeta apenas aqueles com os olhos e mentes no mercado financeiro. Afinal, uma moeda mais fraca, uma inflação mais alta e juros em elevação acabam por prejudicar mais justamente aqueles para quem os benefícios iceberg são direcionados: os mais pobres.

Abaixe o App
Junte-se aos milhões de investidores que usam o app do Investing.com para ficar por dentro do mercado financeiro mundial!
Baixar Agora

Negociar instrumentos financeiros e/ou criptomoedas envolve riscos elevados, inclusive o risco de perder parte ou todo o valor do investimento, e pode não ser algo indicado e apropriado a todos os investidores. Os preços das criptomoedas são extremamente voláteis e podem ser afetados por fatores externos, como eventos financeiros, regulatórios ou políticos. Negociar com margem aumenta os riscos financeiros.
Antes de decidir operar e negociar instrumentos financeiros ou criptomoedas, você deve se informar completamente sobre os riscos e custos associados a operações e negociações nos mercados financeiros, considerar cuidadosamente seus objetivos de investimento, nível de experiência e apetite de risco; além disso, recomenda-se procurar orientação e conselhos profissionais quando necessário.
A Fusion Media gostaria de lembrar que os dados contidos nesse site não são necessariamente precisos ou atualizados em tempo real. Os dados e preços disponíveis no site não são necessariamente fornecidos por qualquer mercado ou bolsa de valores, mas sim por market makers e, por isso, os preços podem não ser exatos e podem diferir dos preços reais em qualquer mercado, o que significa que são inapropriados para fins de uso em negociações e operações financeiras. A Fusion Media e quaisquer outros colaboradores/partes fornecedoras de conteúdo não são responsáveis por quaisquer perdas e danos financeiros ou em negociações sofridas como resultado da utilização das informações contidas nesse site.
É proibido utilizar, armazenar, reproduzir, exibir, modificar, transmitir ou distribuir os dados contidos nesse site sem permissão explícita prévia por escrito da Fusion Media e/ou de colaboradores/partes fornecedoras de conteúdo. Todos os direitos de propriedade intelectual são reservados aos colaboradores/partes fornecedoras de conteúdo e/ou bolsas de valores que fornecem os dados contidos nesse site.
A Fusion Media pode ser compensada pelos anunciantes que aparecem no site com base na interação dos usuários do site com os anúncios publicitários ou entidades anunciantes.

Sair
Tem certeza de que deseja sair?
NãoSim
CancelarSim
Salvando Alterações