Ambev (ABEV3) é um caso tipo Americanas (AMER3)?

 | 14.12.2023 13:00

O propósito desta análise é divulgar o uso da análise econômica das demonstrações contábeis como técnica de avaliação de oportunidades de investimento em ações empresas brasileiras. Esse esforço de divulgação já feito nas publicações das análises da Eletrobras (BVMF:ELET3), Weg (BVMF:WEGE3), Cosan (BVMF:CSAN3), Rumo (BVMF:RAIL3), Ferbasa (BVMF:FESA4), Petrobras (BVMF:PETR4) e outras.

No presente caso da AMBEV (BVMF:ABEV3), a análise produziu indicadores com valores estranhos, os quais  sugerem que os dados da AMBEV apresentam anomalias que podem chagar a ser algo semelhante ao que aconteceu na contabilidade da Americanas (BVMF:AMER3) até 2022. Antes de avançar nesta discussão, alguns conceitos devem ser revisados.

O produto da análise econômica das demonstrações contábeis é a geração de indicadores de desempenho, o ROI avalia o desempenho dos ativos/investimento, o Ki avalia os custos de capital com credores de renda fixa e o RSPL avalia o rendimento obtido pelos credores de renda variável (acionistas).  

O risco financeiro, isto é, a probabilidade da entidade produzir resultado desfavorável ao investidor é de dois tipos. O risco mais evidente para o público é o risco financeiro de prazos, cuja preocupação é a liquidez da entidade, isto é, a capacidade da entidade pagar seus credores, cujos indicadores comparam de diversas formas o prazo médio de recebimentos dos ativos com prazo médio de pagamento dos passivos. 

O outro risco financeiro é o de taxas. As entidades econômicas são intervenientes financeiras, isto é, captam recursos com rentistas (passivos) por um custo para investi-los no negócio (ativos). O investimento da entidade nos ativos produz renda destinada a remunerar os credores. Acontece que as taxas de rendimento do negócio (ROI) e as taxas de rendimento dos credores (Ki, RSPL) flutuam no tempo. Ainda temos o Ke, que é o custo de oportunidade do capital do credor de renda variável, que em regra deve ser superior ao Ki.

Os indicadores sofrem influências do meio ambiente, da política, do câmbio e de tudo o mais que causa incerteza no mundo. A máxima segurança financeira de taxas é encontrada quando os indicadores de uma entidade se enquadram na Hierarquia dos Retornos Desejados (RSPL >= Ke > ROI > Ki > Risk Free (Selic). Todo desalinhamento de taxas gera uma insegurança econômica para a entidade. 

Encontrar Ki > ROI, significa que o spread financeiro da entidade é negativo, assim, o custo de recurso captado com credores de renda fixa é maior que o rendimento obtido no negócio. A conta desse déficit vai para o acionista, fazendo com que o rendimento dos credores de renda variável (RSPL) fique menor que o rendimento dos credores de renda fixa, o que é incoerente com os riscos assumidos por cada tipo de investidor.

Voltando ao tema da anomalia dos indicadores obtidos da contabilidade da AMBEV, é interessante fazer a apresentação das evidências acompanhada da rotina de cálculo que se faz durante a apuração dos indicadores. 

Uma das dificuldades da geração desses indicadores econômicos começa com a organização das contas das demonstrações contábeis, elas são dispostas para gerar indicadores de risco de prazos e resultado apenas para o acionista. Daí surge a necessidade de fazer uma reclassificação, a qual deve seguir os seguintes princípios:

  • No balanço patrimonial, a classificação é feita em três tipos: (1) os passivos de funcionamento são aqueles cuja renda dos credores está embutida no preço de aquisição do insumo, os quais em regra são operacionais e o consumo destes recursos já está no resultado operacional (LAJIR); (2) os passivos onerosos são aqueles cuja renda dos credores é fixada em instrumento financeiro, por isso são chamados de credores de renda fixa; e (3) o patrimônio líquido representa os credores acionistas, cuja renda depende do resultado, por isso são chamados de credores de renda variável.

  • Na Demonstração do Resultado do Exercício, o princípio da segregação de receitas e despesas segue as seguintes regras: (1) somente despesas de juros e de derivativos relativos a credores de renda fixa são consideradas despesas financeiras para cálculo do Ki, as demais despesas financeiras devem ser consideradas operacionais; (2) No cálculo do ROI entra o LAJIR, receitas financeiras e despesas financeiras consideradas operacionais, soma que se chama de LAJIR Ajustado. 

Quando os indicadores destinam-se aos investidores em bolsa, o valor do patrimônio líquido contábil deve ser substituído pelo valor do patrimônio líquido avaliado a mercado, caso contrário os indicadores perdem significado para esses investidores. No caso da AMBEV isso é primordial, dada a enorme diferença entre essas avaliações, tal como mostra a Figura 1, a seguir. Neste caso, se os indicadores fossem calculados com uso do patrimônio líquido contábil, os indicadores ROI e RSPL teriam valores superestimados, algo maior que o dobro dos valores calculados a mercado.

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