Calma, Eu Posso Explicar

 | 06.10.2020 11:01

“Você vai ficar triste com o que vou dizer. Te decepcionei. Quando me dei conta da situação, a besteira já estava feita. As coisas saíram do controle e acabei agindo por impulso. Foi durante as suas férias, você estava fora e eu não queria te chatear com este assunto. Desculpe, mas tirei meu dinheiro do fundo DI e coloquei na poupança...”

Que atire a primeira pedra quem nunca tomou uma decisão de investimento errada. Só me restou dar risada diante da confissão acima, feita pelo meu amigo Allan, que iniciou no ano passado sua jornada de investidor e há poucos meses constituíra sua reserva de emergência.

Assim como talvez tenha acontecido com você, ele ficou apreensivo ao ver os recursos aplicados no fundo DI apresentando retornos diários negativos. A reação acabou sendo a de resgatar a reserva de emergência e migrar para a poupança, o que lhe garantiu conforto psicológico momentâneo, sob o argumento do “rende pouco, mas rende alguma coisa”.

É claro que incomoda a qualquer um a possibilidade de ter prejuízo, ainda mais quando se trata daquela parcela do patrimônio que se destina a nos socorrer nos momentos de imprevisto. Mas, mesmo diante da dinâmica recente, nós aqui da série Os Melhores Fundos de Investimento reforçamos a convicção de que os fundos DI Simples de taxa zero seguem sendo o melhor destino para sua reserva de emergência.

A lógica não mudou: considerando os principais pilares — liquidez, segurança e rentabilidade –, no caso da reserva de emergência priorizamos sempre os dois primeiros. Nesse sentido, os fundos DI Simples de taxa zero oferecem liquidez diária (você resgata a qualquer momento) e continuam sendo o investimento de menor risco de crédito do mercado brasileiro, já que compram Tesouro Selic, título garantido pelo governo.

Mas é preciso ter em mente que eles não são “à prova de queda”; não existe investimento totalmente livre de risco no mercado. Só não estamos habituados a ver a desvalorização dos títulos públicos atrelados à Selic. Trata-se realmente de um fenômeno atípico — a última vez que aconteceu foi há 18 anos.

Para entender esse movimento, vamos lembrar que o Tesouro Selic (LFT) se propõe a pagar a variação da Selic na data do vencimento do título. Mas, antes desse momento chegar, no dia a dia, o título tem flexibilidade para acomodar ágio ou deságio em suas negociações, o que pode ser acompanhado diariamente. Esse preço varia de acordo com a relação entre oferta e demanda.

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A oferta do papel vem aumentando muito nos últimos meses de quarentena. E a agressividade do Tesouro Nacional em colocar volumes expressivos de títulos em leilões diários, em uma tentativa contínua de encurtar seu prazo de endividamento, não é uma boa sinalização.

Quando você percebe que aquele amigo para quem emprestou dinheiro está fazendo bicos e tomando mais empréstimos para fechar as contas do mês, fica com o pé atrás, certo?

Adicionalmente, desde setembro, o aumento da percepção dos riscos fiscais em meio à falta de articulação do governo e da equipe econômica tem levado os títulos públicos a perderem valor no mercado secundário. Isso porque os agentes do mercado consideram que uma remuneração de apenas 2% ao ano é pouco para financiar todo o risco fiscal que está na mesa.

Resultado: o Tesouro Selic está sendo negociado com deságio, ou seja, abaixo do seu valor de face.

Para dar uma ideia, o deságio do Tesouro Selic para o vencimento de 2025 (única LFT vendida no Tesouro Direto atualmente) era próximo de 0,03% no início de setembro. Hoje, está em 0,31%. Pode até parecer uma diferença pequena, mas, em um cenário de Selic a 2% ao ano, é suficiente para machucar o investidor.

Como consequência, os fundos que investem em Tesouro Selic estão tendo um retorno diário abaixo do CDI nas últimas semanas, como você pode conferir no gráfico abaixo, que traz o desempenho dos fundos DI Simples em setembro: