Conhece a Ti Mesmo

 | 28.11.2017 09:06

Saudações.

Gnothi seauton - conhece a ti mesmo: a inscrição, relata o geógrafo grego Pausânias, figurava no pátio do Templo de Apolo em Delfos. A mesma prescrição ressurgiria recorrentemente em diferentes lugares e contextos, aí incluídas as versões latinas temet nosce e nosce te ipsum, evidenciando o óbvio: o problema do autoconhecimento é atemporal.

"Conhece a ti mesmo" (temet nosce); "conhece-te primeiro" (nosce te ipsum) ou - meu favorito, agostiniano - "conhece-te; aceita-te; supera-te". Estas são, hoje, as questões que me são mais caras. Devem ser os quarenta se aproximando vagarosamente, mas esse ano de 2017 - ou, mais precisamente, oano 33 que se inaugurou em minha vida no último inverno - tem sido uma grande jornada de autoconhecimento.

(Não me vem com filosofia, barbudo; eu quero é saber como ganhar dinheiro rápido, fácil e sem risco - muitos dirão, inconscientes do fato de que a própria hierarquização de valores que norteia esse tipo de escolha também encontra guarida no pensamento filosófico. Mas essa, respire aliviado, é uma discussão na qual não vou entrar.)

Calma. Vou chegar lá.

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Via de regra, o questionamento que mais comumente recebo - à exceção daqueles pontuais do tipo "diquinha quente do momento" que, por razões nas quais pisarei logo em seguida, sempre existirão - é do tipo "quero aprender; o que leio?". O interlocutor espera, invariavelmente, por recomendações de livros sobre finanças e investimentos - caminho que eu próprio, vários anos atrás, me propus a percorrer.

Foi em meio ao percurso dessa estrada utilitária que me deparei com o que hoje me parece óbvio: qual o problema desse caminho? Salvo você seja um robô (ou goste de gin tônica mais do que eu), há na práxis do investimento um componente humano que não pode ser ignorado e que, via de regra, é completamente deixado de lado nos alfarrábios de natureza técnica (faça-se aqui uma menção honrosa aos estudos de economia e finanças comportamentais, mas insisto que talvez mesmo em relação a eles seja necessário mais um passo atrás).

Resultado? A quem me indaga sobre por onde começar, minha maior vontade é sempre responder comece conhecendo-se; compreendendo quem você é; o que você quer. A parafernália técnica não só pode esperar como, francamente, se vier primeiro só causará confusão.

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Em ou isso, ou aquilo: um fragmento de vida e, posteriormente, em Estádios no caminho da vida, o filósofo dinamarquês Soren Kierkegaard faz uma reflexão sobre diferentes estádios (sempre dá vontade de se referir como estado, mas isso dá a ideia de que são fases sequencialmente dispostas entre si - o que contraria a proposta do autor) da experiência humana.

No estádio estético, o foco é a busca pelo prazer; a vida pela fruição nos âmbitos afetivo, físico, sexual. Bebendo gela, tomando Ciroc; curtindo na balada, só dando virote - ensina-nos um grande filósofo tupiniquim.

Se possível fosse elaborar uma perspectiva aplicável a investimentos deste conceito do pensamento de Kierkegaard (e de Wesley Safadão), teríamos aqui o sujeito que olha para o mercado como uma festa à qual, tendo sido convidado já com a música tocando, chega provando de tudo e tentando ver o que é bom: é a diquinha quente do fórum; é o portal de investimentos com 237482934 melhores analistas do País ensinando, de graça (já parou para pensar quais os incentivos presentes aqui?), suas estratégias de investimento matadoras; eram (ainda existem?) as salas de ações das corretoras que, convertidas em um verdadeiro convescote de apostadores inveterados, acenavam com a promessa do dinheiro fácil.

(Interlúdio. Sempre lembro da analogia que fez, certa vez, um de meus primeiros chefes: é dia de festa no puteiro, mas há fortes indícios de que a fiação da Casa da Luz Vermelha vai fazê-la se consumir em chamas a qualquer momento. O que fazer? Ficam todos, malandramente, dançando com as meninas pertinho da saída e prontos para, ao primeiro sinal de fogo, sair porta afora. O problema é que todo mundo pensa igual, e a porta é estreita...)

Desnecessário dizer que a indústria de brokerage adora o esteta, não é mesmo? Verdadeira ou não, a concepção de que é possível ganhar dinheiro de forma consistente reagindo a cada movimento de mercado com espasmos musculares voluntários e involuntários é lucrativa para quem fatura em cima de corretagem e comissões. Se depender dos incentivos da indústria, você fica bebendo Ciroc pra sempre - leia-se até sua grana acabar.

Ensina-nos o dinamarquês - e, por extensão, a história de vida de quase todos que passam um tempo vivendo ao som do Safadão - que a fase estética tem seu fim no desespero: percebendo que o hedonismo sem fim jamais preencherá suas ânsias interiores (ou, na versão financeira, que aqueles prejolas com Cerâmica Chiarelli, Ferreira Guimarães e Tecelagem São José deveriam, no mínimo, servir para ensinar algo), é chegada a hora de buscar outra coisa.

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Uma das alternativas à curtição sem fim do estádio estético é virar um homem sério - e chegamos, assim, ao estádio ético, da vida regrada, conformada ao universal e voltada à realização do geral. É sossegar, sair do Tinder, casar e ter filhos. Ou, por analogia, assumir que investir requer disciplina e método, não reflexos involuntários e flutuações emocionais pautadas pelo noticiário e o Ibovespa Futuro.

Aí sim é hora de estudar. Não vou advogar por estratégia A, B ou C, muito embora meu fundamentalismo seja bem evidente no que escrevo, recomendo e invisto. Uns dirão que é questão de inclinações pessoais; outros, mais radicais (levantei a mão aqui), sugerirão que só a Verdade liberta e ela está consagrada na práxis de quem fez, de fato, dinheiro. Deixo a discussão análise fundamentalista versus análise técnica versus astrologia, tarot e búzios para outra hora: o importante aqui é ter em mente que investir não é vale tudo: até pode dançar homem com homem e mulher com mulher (é 2017, gente, e ninguém tem nada com isso), mas misturar value investing com day trade vai dar uma ressaca das brabas.

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Reservado a poucos, há o estádio religioso: de tanto bater cabeça brigando com prévias de resultados trimestrais, médias de P/E, EV/EBITDA et caterva - ou, na versão do José Castro , suportes, resistências e formações diversas, um dia acorda-se tendo descoberto que se deu um salto de fé; que investir bem tem muito mais a ver com a capacidade de enxergar boas histórias empresariais e reconhecer boas equipes de gestão, que hão de fazer bom uso do seu dinheiro - e nada disso, asseguro, se enxerga na tela do homebroker: o tempo do mercado, das ações como ativos financeiros ou meros números num painel de cotações, pouca ou nenhuma relação guarda com o tempo do mundo real, no qual empresas produzem e vendem; acionistas vivem entre tapas e beijos e tudo o mais.

E, dessa visão um tanto esotérica de investimento, vem uma enorme tranquilidade que permite que você durma em paz - seja porque está tão confortável com suas posições que, a depender de você, a B3 (SA:BVMF3) poderia passar um ano inteirinho fechada; seja porque seus recursos estarão sob os cuidados de gestores profissionais - que, com suficiente engenho e arte -, hão de entregar resultados bons o bastante para você.

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De toda essa divagação, extraio a pergunta: quem é você aqui? Esteta, ético ou religioso? Muito antes de fazer qualquer juízo de valor sobre cada uma dessas fases - e consciente de que não necessariamente tenho algo a lhe oferecer em todas elas -, insisto: nosce te ipsum.

Conhece-te; aceita-te; supera-te. Escreve no coração o conselho agostiniano, e então decide teu caminho.

Pense nisso.

E lembre-se: tem uma guerra lá fora.

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