Davi Versus Golias: a Saga do Pequeno Investidor Moderno

 | 24.09.2021 14:36

Podemos, com toda a certeza, dizer que nunca foi tão fácil para o pequeno investidor começar a investir como agora. Há uma quantidade inumerável de conteúdo online seja no YouTube, Instagram, Facebook ou até TikTok falando sobre investimentos. Além disso, hoje o pequeno investidor possui muito mais opções de investimento do que tinha no passado, pode investir em Tesouro Direto e ETFs a até criptomoedas altamente voláteis. Porém, com tantas opções fica difícil para o pequeno investidor decidir no que investir.

Não fosse esse o único problema, temos também que muitas corretoras tentam inculcar nos pequenos investidores que enquanto os bancos possuem conflitos de interesse em suas recomendações, elas possuem seus interesses alinhados com os clientes, portanto não possuindo tal conflito. Nada mais distante da verdade, e muitos pequenos investidores acabam acreditando em tal marketing. Se há uma coisa que o pequeno investidor deve aprender é que ele ou ela é responsável pelas suas escolhas e que sempre assumirá um risco de conflitos de interesses ao terceirizar as suas decisões financeiras para pessoas que recebem comissões das recomendadas pelas suas recomendações.

Corretoras ganham comissão de corretagem em cada operação feita pelo investidor. E não é de surpreender que muitas divulguem carteiras mensais com grande variação de composição de ativos para que os investidores transacionem bastante e gerem comissões para a corretora. Isso acontece porque se você comprar uma ação e continuar com ela no longo prazo a corretora não está recebendo nada (assumindo que ela não cobre taxa de custódia), e assim ela quer que você transacione a fim de continuar gerando receita. Conforme seminal artigo de Brad Barber e Terrance Odean intitulado “Trading Is Hazardous to Your Wealth: The Common Stock Investment Performance of Individual Investors”, publicado em 2000 no Journal of Finance, quanto mais um investidor individual transaciona, menor o seu retorno, pois os custos de transação excedem os possíveis ganhos.

Por exemplo, eu abri uma conta em uma corretora para verificar o que ela iria me recomendar. Ela me recomendou investir 25% do meu capital em um COE. Como muitos leitores devem saber, recentemente os COEs têm enfrentado muitas críticas, devido a um artigo de Otávio Bitu, Fernando Chague, Bruno Giovannetti e Tomaz Hamdan intitulado “O retorno esperado dos COEs” na Revista Brasileira de Finanças. Eles demonstram que a relação risco-retorno de tais COEs é negativa e que os bancos e corretoras acabam “empurrando” tais produtos para os seus clientes devido às margens e comissões elevadas.

E não só esta recomendação não é favorável para o investidor, mas também essa mesma corretora sugeriu alocação de 20% do capital em uma debênture de uma única empresa, o que traz um risco idiossincrático elevado para um portfólio de um pequeno investidor. Uma regra simples é que nenhum ativo deve ocupar mais de 5% de um portfólio com um único ativo que não é diversificado, pois isso acaba aumentando o risco de todo o portfólio.

Se não bastasse tais adversidades, mesmo que o investidor decida pagar para consumir recomendações de investimentos (o que elimina a possibilidade do conflito de interesse), a qualidade de tais conteúdos é altamente variável. Basta passar um tempo no YouTube para ser bombardeado com diversos anúncios prometendo ficar milionário com um investimento de mil reais, de conseguir retornos acima do mercado seguindo uma “fórmula simples”, ou ainda de “cursos” ensinando métodos para ganhar dinheiro sem esforço. O que todos têm em comum é falar que esta é “uma oportunidade única”, “exclusiva”, “que não se repetirá” a fim de criar urgência para o pequeno investidor investir o seu dinheiro.

Portanto, o pequeno investidor tem de ficar atento com os “Golias” do mercado que tentam uma transferência de riqueza reversa: do bolso do pequeno investidor para o seu bolso, no melhor estilo “Lobo de Wall Street”. Será, então, que não há saída nesse mercado para o investidor?

Além de tomar responsabilidade pelas suas escolhas, o investidor também deve saber que nem todas as corretoras, cursos ou produtores de conteúdo padecem desses problemas. Assim, deve-se filtrar e tomar decisões informadas na hora de adquirir um curso ou dedicar seu tempo a consumir conteúdo.

Adicionalmente, investir no mercado financeiro é algo simples. Segundo o método que Warren Buffet sempre defende, o pequeno investidor deve investir seu dinheiro em ETFs (diversificando os mercados que os ETFs estão alocados) e, caso seja conservador, uma parcela em renda fixa a fim de controlar a volatilidade do portfólio. Para aqueles que desejam se dedicar mais um pouco, o mercado de Fundos de Investimento Imobiliários possui boas oportunidades de investimentos que geram fluxo de caixa para seus cotistas.

Assim sendo, nunca foi tão fácil para o pequeno investidor realizar os seus investimentos, mas, ao mesmo tempo, nunca foi tão complicado. Portanto, o investidor que queira iniciar com seus investimentos deve tentar evitar basear suas decisões em recomendações “gratuitas” de terceiros, e, sim, estudar e investir com foco de longo prazo buscando sempre o básico e o simples, pois não desperdiçar dinheiro é a regra número um de qualquer investimento.

*Rodrigo Leite é Professor de Finanças e Controle Gerencial do COPPEAD/UFRJ, com graduação em Ciências Contábeis pela FAF/UERJ e Mestrado e Doutorado em Administração pela EBAPE/FGV.

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