Eleição de Trump Pode ser um Desastre para a Apple

 | 30.09.2016 11:45

Por Clement Thibault

Durante o primeiro debate presidencial na segunda-feira passada, o candidato republicano Donald J. Trump atacou a Ford Motor Company (NYSE:F) por seus investimentos e os planos da empresa para produzir automóveis no México. Mas a Ford não é a única empresa dos EUA alimentando ira de Trump.

Recentemente, a Apple, a empresa com maior valor de mercado do mundo, responsável pelos inovadores iPhones, Macs e outros dispositivos digitais e software relacionados, tem sido manchetes ao lado de Trump também. O par improvável não parece estar se dando muito bem, por uma série de razões. Desde o início do ano Trump e Apple (através do CEO Tim (SA:TIMP3) Cook) trocaram jabs em várias ocasiões.

Trump e Apple estão em rota de colisão?

Parece que sim.

Trump iniciou a disputa em janeiro, criticando a Apple por sua decisão de fabricar seus produtos no exterior. Em fevereiro, ele pediu um boicote aos produtos da Apple depois que a empresa se recusou a desbloquear o iPhone do atirador que matou 14 pessoas e feriu gravemente outras 22 em San Bernardino. Em março, o assunto que ligou Apple e Trump foram os vistos H-1B — legais, mas cada vez mais impopulares, utilizado por empresas de tecnologia (e outras) para empregar trabalhadores de fora dos EUA com habilidades específicas.

A Apple citou as opiniões de Trump ao explicar em junho porque se recusou a apoiar a convenção do partido republicano. Adicionando combustível à disputa, a Apple provocou Trump ainda mais diretamente nos últimos meses, com Tim Cook organizando pessoalmente eventos para captação de recursos para o presidente da Câmara, o republicano Paul Ryan, e para a candidata presidencial democrata Hillary Clinton, ambos adversários ferrenhos de Trump.

O confronto começou em janeiro com a forte declaração de Trump sobre comércio e fabricação. O candidato republicano disse que acredita que os Estados Unidos estão em desvantagem em relação à China, que ele afirma que está realizando "chantagem financeira", através da manipulação de moeda.

Ao contrário de economias ocidentais que contam câmbio flutuante, a taxa de câmbio da China é definida pelo seu banco central, que tem desvalorizado o iuan em um ritmo cada vez mais rápido, segundo alguns analistas. É uma política econômica de governo que busca assegurar que as exportações chinesas permanecem competitivas. Atualmente, o valor do iuan está perto da mínima de cinco anos.

Abaixe o App
Junte-se aos milhões de investidores que usam o app do Investing.com para ficar por dentro do mercado financeiro mundial!
Baixar Agora

A opinião de Trump é que as desvalorizações enfraqueceram o setor industrial dos Estados Unidos, provocando a perda de "dezenas de milhões de empregos americanos". A Apple, através da Foxconn e Pegatron Corp., entre outras, fabrica seus iPhones na China, um óbvio ponto de atrito e de confronto com o candidato republicano.

Em um discurso na Liberty University, em Lynchburg, Virginia, em 18 de janeiro, Trump criticou a empresa mais rentável do mundo, declarando de forma agressiva:

Vamos obrigar a Apple a construir seus malditos computadores e coisas neste país, em vez de em outros países.

Contabilizando apenas os salários dos funcionários de fabricação, isso poderia causar um enorme problema para a Apple. A média anual do salário do salário do setor, por pessoa, na China é 55.324 iuan, ou US$ 8.281. Em comparação, uma base de 40 horas por semana, o trabalho industrial médio nos E.U. recebe cerca de US$ 42.000, um pouco mais de cinco vezes o que Apple atualmente paga seus trabalhadores terceirizados baseados na China.

Apesar de não se saber exatamente quantos funcionários da Foxconn ou Pegatron fabricam iPhones, considere isto: dado que a Apple vendeu mais 230 milhões de unidades no ano passado e que a planta Fort Worth da Motorola, no Texas, empregou mais de 2.000 trabalhadores para produzir cerca de 5 milhões de smartphones por ano, uma estimativa lógica indicaria há cerca de 100.000 empregados chineses trabalhando em produtos Apple, a fim de atender à demanda do mercado. A planta da Motorola nos EUA foi fechada em 2014 por razões que incluía altos custos.

Usando a métrica, o potencial custo da Apple de realocar a sua fabricação para os EUA seria proibitivo e provavelmente impossível. O mesmo vale se o Trump realmente conseguir impor uma barreira para produtos fabricados fora do país ou sanções adicionais em iPhones fabricados na China.

Na verdade, durante uma conversa com Barack Obama em 2011, o falecido Steve Jobs afirmou muito claramente:

"Empregos [industriais] não vão voltar [para os EUA] porque a China tem atualmente a mais sofisticada infraestrutura de fabricação do mundo".

Apenas um mês após comentários do Trump sobre fabricação, a provocação de Trump tomou outro rumo. Em fevereiro, na sequência do atentado terrorista em San Bernardino ocorrido dois meses antes, Apple e seu CEO, Tim Cook, recusaram-se a cumprir uma ordem judicial para desbloquear o iPhone do criminoso, dizendo que a ordem ameaçaria a segurança de todos os usuários do iPhone. Muitos americanos, incluindo Trump, entenderam a recusa como antipatriótica.

Durante um comício da Carolina do Sul, Trump pediu um boicote aos produtos da Apple. Em entrevista à Bloomberg, ele disse:

Eu teria sido tão agressivo com ele [CEO Cook] — você não tem ideia — sua cabecinha iria girar durante todo o caminho de volta para o Vale (SA:VALE5) do Silício.

O candidato republicano escalou ainda mais o conflito com a Apple (bem como com grande parte das demais empresas da América) em março, quando ventilou suas opiniões sobre a reforma da imigração e, em particular, do visto H-1B, que permite que as empresas americanas empreguem trabalhadores estrangeiros especializados, se sua qualificação não pode ser facilmente encontrada na força de trabalho dos EUA. Durante o ano fiscal de 2014, de acordo com um relatório do departamento de imigração dos EUA, mais 313.000 trabalhadores estrangeiros se beneficiaram de status do visto H-1B, 64% deles empregados em “postos relacionados à computação."

Enquanto as empresas de tecnologia estão pressionando o governo a expandir o programa, a oposição contra trazer trabalhadores estrangeiros — que muitas vezes são tidos como roubando os empregos mais simples dos norte-americanos — cresceu entre a população em geral. Trump comandou ativamente este movimento, dizendo que ele iria acabar o programa de H-1B, se for eleito. "Conheço muito bem o H-1B... nós não deveríamos tê-lo. É muito, muito ruim para os trabalhadores."

Mais tarde, ele suavizou sua posição, dizendo que o país deve continuar a atrair trabalhadores qualificados, mas está pedindo uma "pausa" na emissão de vistos H-1B e, ao mesmo tempo, um aumento nos salários dos trabalhadores de H-1B para minimizar o incentivo corporativo para contratá-los. Com 4.020 pedidos de vistos H-1B, patrocinados pela Apple entre 2013 e 2015, a empresa é classificada entre os vinte maiores patrocinadores desse visto, embora outros gigantes da tecnologia como a Intel, Amazon e IBM (NYSE:IBM) estão à frente no número de pedidos.

A resposta inicial da Apple para as provocações de Trump ocorreu em julho, na convenção do partido republicano. Após contribuir igualmente para convenções republicanas e democráticas no passado, a Apple decidiu não fornecer nenhum financiamento nem apoio técnico para a convenção de 2016. De acordo com o jornal Politico, a decisão foi tomada em resposta aos comentários de Trump sobre mulheres, imigrantes e minorias, e, apesar das seguidas críticas do candidato à Apple, é aceitável que a empresa tenha tido algumas outras razões também.

Tim Cook também organizou dois eventos para arrecadar doações nos últimos meses, ambos para beneficiar os rivais Trump. No final de junho, um café da manhã privado para angariar fundos para Paul Ryan, bem como para outras candidaturas republicanas, foi comandado por Cook e pelo tesoureiro da empresa Gary Wipfler. No final de agosto ele e sua colega Lisa Jackson, executiva da Apple, organizaram um evento para arrecadar recursos para Hillary Clinton.

A indústria de tecnologia em geral apoiou Clinton com cerca de US$ 4 milhões dólares em doações de empresas e executivos do Vale do Silício, contra menos de US$ 200 mil para Trump. (Publicamente a Alphabet deu US$ 600 mil para Hillary e a Apple estava entre os top 10 contribuintes para a campanha da candidata democrata)

Tempestade em copo d'água ou uma vingança potencialmente preocupante?

Alguns acreditam que Trump na presidência seria benéfico para a Apple, porque ele apoia a redução das alíquotas de impostos, com o objetivo de incentivar as empresas a retornar para os EUA. A Apple, que mantém uma reserva de mais US$ 200 bilhões em dinheiro na Irlanda, a fim de aproveitar as taxas de impostos mais baixas do país, talvez possa ser um dos maiores beneficiários dessa redução de imposto.

No entanto, acreditamos que é óbvio que há rivalidade entre Donald Trump e Apple. Se você seguir o dinheiro, há ainda uma outra face para a história. A maior posição de mercado de Trump em ações, de acordo com a revista Fortune é.… a Apple. Estima-se que a sua participação na empresa valha US$ 1,25 milhão.