Há Convergência Global na Regulação de Criptomoedas?

 | 23.11.2021 11:05

Por Carlos Ragazzo e Bruna Cataldo

Ao longo de 2021, em especial no início do segundo semestre, o mundo viu inúmeros governos anunciarem medidas voltadas para a regulação do mercado de criptoativos . A única certeza é que, com abordagens que vão desde projetos legislativos para criação de marcos regulatórios estruturados até a proibição completa, as movimentações dos governos das principais economias do mundo têm deixado claro que as criptomoedas não vão mais conseguir operar às margens da estrutura regulatória do sistema financeiro internacional.

Países como Índia e Austrália tiveram debates ativos ao longo de todo o ano e parecem estar em posições bastante diferentes no tema. A Austrália mostrou um discurso bastante favorável ao mercado, sugerindo que um marco regulatório adequado poderia tornar o setor uma fonte de manutenção de empregos qualificados no país, sinalizando que Singapura seria um benchmarking interessante a ser estudado. Já a Índia teve uma postura bastante reativa: começou o ano com proposta de proibição equivalente à promovida pela China recentemente e chegou a setembro tendo diminuído o tom proibicionista, mas ainda reticente. Ainda assim, objetivamente, só é possível afirmar que seus projetos estão sendo avaliados pelo legislativo e, portanto, estão em estágios intermediários de desenvolvimento.

Isso é relevante porque, diferente de outros setores, a regulação dos criptoativos não tem sido construída em etapas bem definidas com princípios comuns: não há um ciclo de raciocínio previsível que facilite a identificação de novas etapas. Há países que iniciam o debate com mentalidade proibitiva e de alguma forma flexibilizam o tratamento e outros que vão tomando postura mais restritiva na medida que eventos específicos demandam ação mais forte. Esse comportamento indica que, enquanto marcos regulatórios não são aprovados e implementados, não há garantia de que o discurso do momento se manterá em uma trajetória linear.

O lado ruim dessa incerteza regulatória é conhecido. A harmonização da legislação financeira é um objetivo perseguido por autoridades internacionais, como, por exemplo, o Bank for International Settlements – BIS, como forma de reduzir custos de transação e de garantir maior estabilidade financeira, tanto no âmbito doméstico, como no internacional. Assim, quando existem iniciativas regulatórias não alinhadas, normalmente se espera, como resultado, o aumento de custos para empresas devido à necessidade de conformidade a essas múltiplas abordagens e perda de mercados de atuação como resultado de proibições, dentre outros.

Apesar disso, a reação de agentes do mercado tem sido positiva, com as maiores empresas inclusive participando ativamente das discussões com o intuito de conseguir que o resultado iniba as más práticas que afastam potenciais usuários 一 buscando em particular maior controle de esquemas e fraudes 一 garantindo ao mesmo tempo a permanência da liberdade para inovar e desenvolver o mercado. Isso tem sido verificado especialmente na Austrália e na Índia, países em que agentes do mercado têm sido bastante vocais na construção das legislações.

E o Brasil, onde se enquadra nesse fenômeno?/h2

No Brasil, apesar de medidas pontuais do Banco Central e Receita Federal e apresentação de projetos de Lei desde 2015, só em 2021 a discussão realmente avançou. Em abril, três projetos em andamento foram unificados e a CVM e o Banco Central passaram a coordenar esforços para construir um marco regulatório. O primeiro foco de ambos têm sido o anonimato: a legislação caminhará no sentido de garantir identificação de ponta a ponta. Também indicaram que vão buscar uma regulação menos focada em categorizações e mais na compreensão de criptoativos como parte de um ecossistema da economia baseada em dados, que é inerentemente veloz e precisa de uma legislação adaptável. Espera-se que as primeiras iniciativas devam focar nas atividades de investimento, devido a maior representatividade no país.

A postura brasileira se mostra, portanto, cautelosa e preocupada com o desenvolvimento do mercado. É um debate regulatório que pode ser considerado intermediário: tem alguma clareza sobre os objetivos e cooperação coordenada entre agentes, mas não há algo concreto de fato para que as empresas possam basear tomadas de decisão. A postura, no entanto, tem levado os representantes das empresas a reagir positivamente apesar de apontarem alguns desafios.

Em particular, têm destacado a preocupação com a necessidade de garantias regulatórias contra a prática de ilícitos (preocupações tradicionais com lavagem de dinheiro) e destacado que a segurança promovida pela regulação seria um motor para o crescimento do mercado ao minimizar uma das principais fontes de resistência à adesão. Também veem com bons olhos a discussão que tem ocorrido sobre a possibilidade de gestoras poderem comprar e custodiar os ativos no país, apesar de demonstrarem preocupação com a definição da classificação jurídica

Está evidente que é uma questão de tempo até que regras sejam impostas ao mercado de criptoativos e empresas tenham que se adaptar; justamente por isso muitas têm optado por participar dos debates ao invés de combatê-lo. A razão para isso é simples: existem escolhas diametralmente opostas a serem tomadas, entre a proibição de criptomoedas, caso da China, e a construção de um marco regulatório que fomente a utilização e desenvolvimento de negócios com base nesses ativos, o que se vê, por exemplo, em Singapura e no Japão.

Carlos Ragazzo é Professor da FGV DIREITO RIO, Presidente do Conselho Consultivo do Instituto Propague.
Bruna Cataldo é Pesquisadora Sênior do Instituto Propague e doutoranda em economia na UFF

Abaixe o App
Junte-se aos milhões de investidores que usam o app do Investing.com para ficar por dentro do mercado financeiro mundial!
Baixar Agora

Negociar instrumentos financeiros e/ou criptomoedas envolve riscos elevados, inclusive o risco de perder parte ou todo o valor do investimento, e pode não ser algo indicado e apropriado a todos os investidores. Os preços das criptomoedas são extremamente voláteis e podem ser afetados por fatores externos, como eventos financeiros, regulatórios ou políticos. Negociar com margem aumenta os riscos financeiros.
Antes de decidir operar e negociar instrumentos financeiros ou criptomoedas, você deve se informar completamente sobre os riscos e custos associados a operações e negociações nos mercados financeiros, considerar cuidadosamente seus objetivos de investimento, nível de experiência e apetite de risco; além disso, recomenda-se procurar orientação e conselhos profissionais quando necessário.
A Fusion Media gostaria de lembrar que os dados contidos nesse site não são necessariamente precisos ou atualizados em tempo real. Os dados e preços disponíveis no site não são necessariamente fornecidos por qualquer mercado ou bolsa de valores, mas sim por market makers e, por isso, os preços podem não ser exatos e podem diferir dos preços reais em qualquer mercado, o que significa que são inapropriados para fins de uso em negociações e operações financeiras. A Fusion Media e quaisquer outros colaboradores/partes fornecedoras de conteúdo não são responsáveis por quaisquer perdas e danos financeiros ou em negociações sofridas como resultado da utilização das informações contidas nesse site.
É proibido utilizar, armazenar, reproduzir, exibir, modificar, transmitir ou distribuir os dados contidos nesse site sem permissão explícita prévia por escrito da Fusion Media e/ou de colaboradores/partes fornecedoras de conteúdo. Todos os direitos de propriedade intelectual são reservados aos colaboradores/partes fornecedoras de conteúdo e/ou bolsas de valores que fornecem os dados contidos nesse site.
A Fusion Media pode ser compensada pelos anunciantes que aparecem no site com base na interação dos usuários do site com os anúncios publicitários ou entidades anunciantes.

Sair
Tem certeza de que deseja sair?
NãoSim
CancelarSim
Salvando Alterações