Morreu e Foi Pro Paraíso (do CDI)

 | 06.12.2021 15:53

“As notícias sobre minha morte são manifestamente exageradas.” A frase atribuída a Mark Twain poderia muito bem servir ao mercado de capitais brasileiro.

Os mais crescidinhos, que frequentavam as mesas de operações entre os anos 1980 e 1990, talvez se lembrem de conversas, permeadas por aquele sotaque carioca carregado (esclareço: nada contra; acho charmoso), do tipo: “Nada bate o dólar, nada bate o CDI”. De fato, tínhamos uma jabuticaba curiosa: um produto de alto retorno, baixo risco e liquidez diária, capaz de desafiar a literatura clássica das Finanças Modernas. Vivíamos no paraíso do CDI. Pelos corredores, ouvia-se insistentemente: “Esse é o nosso único bom produto em nível global” — a rigor, o histórico aponta o juro real como o efetivo bom produto brasileiro, mas nuances técnicas podem ser sublimadas numa manhã de segunda-feira.

Então, vieram vários avanços institucionais, a tal estagnação secular, juros mais baixos lá fora e uma pandemia. Teríamos juros civilizados e o “financial deepening” levaria a uma migração estrutural e ininterrupta das aplicações convencionais e muito conservadoras às ações, aos maiores durations e à diversificação internacional.

Era a morte da renda fixa. Mas aí tivemos a volta da pandemia e a inflação voltou com tudo. Foi então que a B3 (SA:B3SA3) morreu também. Então, quando parecia que a solução estava nas moedas digitais, as criptos também se juntaram ao plano espiritual com seu falecimento neste fim de semana. Até quem nunca morreu está morrendo…

“Prefiro o paraíso pelo clima e o inferno pela companhia”, recorrendo mais uma vez a Mark Twain. Ao menos o inferno deve estar mais agitado agora.

Por que essa necessidade maniqueísta de caracterizar os investimentos entre vivos e mortos? Em muitas situações — aliás, na maioria delas —, não há essa dicotomia entre classes de ativos sobre serem boas ou ruins. Analistas pensam (ou deveriam pensar) sob rigor científico, ponderando distribuições de probabilidades e cenários plausíveis à frente.

Um pequeno anedótico real para ilustrar o ponto. Noutro dia, minha mãe foi ao médico, que, sabendo que ela era minha mãe, lhe perguntou: “Lúcia, recebi uma liquidez agora e estou querendo ter uma nova fonte de renda. Veja com o Felipe se é melhor comprar alguns imóveis ou montar uma carteira de dividendos. Imóveis são uma boa? E ações pagadoras de dividendos?”. Ofereci a única resposta possível: “Mãe, eu não sei. Fala pra ele que depende. Quais imóveis? Em que região, qual estado de conservação, quanto ele está pagando? E de quais ações exatamente ele estava falando? Também precisaria saber um pouco o horizonte temporal dele e sua disposição a risco...”. Obviamente, o Doutor, que era um leitor assíduo e voraz, passou a me achar um idiota, no que concordo com ele, mas por outros motivos.

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A renda fixa nunca morreu, como as ações também não estão mortas agora. Talvez até o contrário. Quando surge esse papo, você pode acreditar numa espécie de ressurreição ao terceiro dia. Neste momento em que os fundos de investimento em ações enfrentam resgates e é pseudodescolado falar nas redes sociais que “a B3 morreu; agora o que pega é Bolsa gringa e cripto”, deveria ser a hora de comprar Bolsa brasileira barata. Mas é difícil convencer o ser humano de seus próprios vieses cognitivos. Todos preferem vender barato e comprar caro depois, quando já subiu, desafiando a lição elementar de finanças.

A alocação patrimonial em diversas classes de ativos se faz a partir do próprio conhecimento de perfil e respectiva associação a exposições estruturais, sobre as quais se estabelecem bandas táticas de aumento ou redução de posição conforme o cenário. É nesse contexto que a renda fixa volta a ser tática e particularmente atrativa.

Temos defendido uma posição importante em renda fixa, combinada, sim, a uma boa exposição em ações, para permitir que o investidor atravesse esse período de grande incerteza macroeconômica e eleitoral brasileiro, alojando-se em papéis de baixo risco com retorno, em especial real, atraente.

O foco em “juro real” é importante. Um dos grandes erros do investidor neste momento seria, por estar pessimista com a evolução da economia brasileira, esconder-se num prefixado, “para garantir uma boa taxa de juro num período de incerteza”. Se você está pessimista com o Brasil e com medo da inflação, o prefixado oferece um risco enorme, porque os retornos nominais podem ser corroídos pela alta dos preços. Esclarecimento: até gostamos dos prefixados neste momento, porque as taxas de juros das atuais cotações já nos parecem contemplar excessivo prêmio de risco, como se o Brasil tivesse perdido por completo sua capacidade de fazer política monetária e domar a inflação. O ponto é que essa posição não pode ser vista como defensiva, tampouco representar uma parte grande do portfólio.

Para o investidor pessoa física, gostamos particularmente das NTN-Bs (Tesouro IPCA+) de prazo médio e longo, e de títulos isentos indexados à inflação.

Nesta semana, o Copom atualiza a taxa Selic, com expectativa ampla de mais um aumento de 1,5 ponto no juro básico, combinado a sinalização de novos incrementos à frente. Caminhamos para os dois dígitos novamente e o investidor, claro, não pode se furtar a esse cenário de juros mais altos. A combinação de bons títulos de renda fixa com ações de companhias de qualidade a preços muito descontados nunca esteve tão viva.

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