Valuation Opções Reais: O Avanço Natural e Necessário ao Fluxo de Caixa Descontado

 | 23.10.2020 07:51

(Texto #6 da Série: Conceitos Teóricos em Valuation)

Neste sexto texto da série, convidei o experiente e competente Marcelo de Paula do Desterro para escrever comigo. Desterro é CFO da Sistac e tem larga experiência prática em Valuations, com especial destaque em análises por opções reais. Vamos começar com um comentário que embasa o título acima.

“O valor de uma empresa precisa capturar todos os possíveis cenários futuros que ela poderá vivenciar, trazidos a valor presente por uma taxa consistente ao risco do negócio e ponderados adequadamente diante da incerteza que há em relação a eles. O objetivo fundamental de um bom Valuation é, portanto, mensurar este valor.”

No segundo texto desta série, a técnica tradicional via fluxo de caixa descontado (FCD) foi esmiuçada. Trata-se de uma metodologia clara, consistente, não vulnerável a convenções (e armadilhas) contábeis e amplamente conhecida no mercado. Um dos pontos mais importantes de um Valuation via FCD é a projeção do fluxo de caixa livre da empresa ao longo dos anos. Perceba que escrevi fluxo de caixa LIVRE: este conceito é importantíssimo e se trata do fluxo que pode ser livremente distribuído aos stakeholders da empresa. Com isso, investimentos de capital (em sua expressão usual, capex) e investimentos em capital de giro líquido precisam ser considerados e deduzidos do fluxo gerado pelo negócio para se chegar ao fluxo relevante no cálculo, ou seja, o fluxo de caixa livre gerado pela empresa.

Em teoria, a técnica é clara e simples, mas na prática traz em seu bojo uma série de imprecisões, como por exemplo: incertezas inerentes ao negócio que impactam bastante as variáveis endógenas (notadamente receitas e custos), dificuldade de projeção de variáveis exógenas, incertezas regulatória e tributária, incerteza quanto ao risco e, em consequência, quanto à taxa de desconto que deverá ser utilizada.

Um ponto relevante do valuation de qualquer empresa diz respeito à perpetuidade de seu fluxo de caixa. A perpetuidade representa o ponto no tempo a partir do qual projeções de fluxo de caixa não são mais realizadas: simplesmente, toma-se a última projeção (livre de impactos não recorrentes) e calcula-se o valor presente deste valor em perpetuidade dali em diante. Comumente, adota-se uma taxa de crescimento constante para este fluxo perpétuo. As premissas utilizadas na perpetuidade são muito importantes porque, via de regra, têm um impacto significativo na avaliação. É fundamental que elas sejam muito bem fundamentadas: taxas de crescimento perpétuo da ordem de 3% acima da inflação (como já encontrei!) precisam ser muito bem justificadas sob pena de se chegar a um valuation com pouca credibilidade caso contrário.

Neste texto, quero chamar a atenção para outra limitação importantíssima da análise tradicional via FCD, porém que nem sempre é devidamente considerada por muitos analistas e casas de análise. A análise via FCD, em sua forma tradicional, é estática e ignora o dinamismo do dia a dia corporativo, no qual o tempo revela continuamente novas informações. A análise tradicional considera expectativas de fluxo de caixa em que todas as decisões estratégicas futuras estão tomadas no momento da análise, em um caminho único e incondicional. Em outras palavras, a análise é estática, pois é realizada como se o conjunto de informações disponíveis aos gestores (tomadores de decisões) fosse constante, ou seja, o mesmo que à época do valuation.

Sim, quero comentar sobre a técnica de valuation mais refinada que existe: a análise através de opções reais (OR). Preciso frisar que não se trata de uma técnica que compete com a metodologia FCD, mas a complementa! A abordagem por OR não refuta a simplicidade e a adequação da análise via fluxo de caixa, muito pelo contrário: o primeiro passo para uma análise via opções reais é justamente a análise via FCD. A incorporação de opções reais na análise busca corrigir um erro clássico da análise tradicional via FCD - sua forma estática de enxergar o mundo futuro. Esta técnica considera e valoriza a flexibilidade gerencial, ou seja, a capacidade de atuação e tomada de melhores decisões diante dos cenários que se apresentam com o passar do tempo. Em síntese, teremos: