Sebastião Buck Tocalino | 22.07.2014 09:33
(ou Teoria x Prática: Pagando o Pato)
Existe pelo menos um caso exemplar bem conhecido envolvendo resultados práticos inesperados e falha na teoria de Albert Einstein. O genial físico, prêmio Nobel e autor das teorias da relatividade especial e geral, não aceitava bem toda aquela probabilidade e incerteza que a mecânica quântica preconizava. Dizia ele que "Deus não joga dados!" e criou uma experiência teórica (mental, pois não tinham como colocá-la em prática na época) mostrando que certas postulações da mecânica quântica não poderiam fazer sentido. Embora sua argumentação teórica fosse cheia de bom senso, uma vez colocada em prática, anos mais tarde, a experiência só serviu para mostrá-lo equivocado e consolidar ainda mais a mecânica quântica como ciência. O paradoxo de EPR (Einstein-Podolsky-Rosen), como ficou conhecido, demonstrou que a teoria bastante lógica de Einstein, não se verificava na prática. O assunto da mecânica quântica tem implicações tão fantásticas que muda nossa percepção do que são vida, universo e realidade, mas quem quiser saber mais, poderá procurar em outra fonte. O que importa para nós nesse momento é a lição de que, na prática, a teoria é outra!
Nos momentos em que a economia custa a mostrar vigor, é compreensível a intenção dos Bancos Centrais de baixar a taxa de juros próxima ou abaixo da inflação. Retornos reais muito baixos ou até mesmo negativos incomodam o capital estacionado na renda fixa. Teoricamente, se esse dinheiro se movesse para fora dali, gerando negócios, o dinamismo econômico poderia ser recuperado na base do tranco. Mas, na prática, isso só resultaria se os investimentos em capital fixo, físico e humano fossem de fato estimulados, expandindo ou criando novos negócios, abrindo microempresas, aumentando o comércio, a produtividade, a geração de empregos e a capacitação técnica de mão de obra.
Sim, na teoria tudo pode parecer justificável... No entanto, investir em capital fixo em tempos de crise é complicado! Exige um grande comprometimento do investidor, impondo-lhe a imobilização de seu capital por um longo prazo, justamente quando o cenário mostra-se mais confuso e desfavorável. Em momentos de muita insegurança é difícil assumir compromissos financeiros para um grande horizonte de tempo. Perde-se o jogo de corpo para a adoção de um eventual plano B, caso as coisas se deteriorem ainda mais. Quando o cenário econômico e financeiro é pessimista, ou no mínimo bastante imprevisível, o investidor pode se mostrar mais avesso ao risco de permanecer assim engessado do que à certeza de alguma perda para a inflação na renda fixa. É aí que a teoria dos juros negativos (reais ou nominais) encontra seu calcanhar de Aquiles.
No entanto, juros reais negativos vêm sendo insistentemente aplicados por importantes líderes da política econômica internacional, sob a argumentação de serem supostamente benignos para a economia em crise.
Na prática, eles confiscam parte da poupança das pessoas mais simples e conservadoras, ou seja, da maioria dos poupadores. Nem por isso conseguem aumentar os investimentos produtivos em capital fixo e capital humano. Não só impõem essa espécie de taxa de confisco, como um imposto incidindo sobre a prudência da população, mas também subsidiam a alavancagem. Juros irrisórios estimulam o financiamento de apostas especulativas (não produtivas) de investidores mais arrojados e bem relacionados. O resultado é o favorecimento e aumento na lucratividade de especuladores que gozam de bom contato com bancos e fontes de financiamento! O investimento em carteira (ações, commodities, ativos ou derivativos) é de tal forma estimulado, que a própria volatilidade se reduz com a inflação dos preços destes, aumentando a atratividade e alimentando a fase inflacionária da bolha. Mas ao fim da costumeira euforia terminal, são os últimos a chegar que se queimam, pagando caro e segurando a batata quente no estouro das bolhas.
Em um deflação na Europa é séria! Estamos próximos do momento em que só restará a impressão de Euros como opção (quantitative easing, ou QE).
No entanto, toda essa história acaba configurando um ciclo vicioso.
Fomentar o crédito nessa altura lembra bastante a cultura francesa do Foie Gras. Para quem não conhece, a "iguaria" francesa é feita com o fígado gordo e hipertrofiado (esteatose hepática) de gansos e patos. Os animais são alimentados à força, com alimentos literalmente socados goela abaixo.
O mesmo parece se passar com a oferta de dinheiro na economia.
O interessante é que a crise que ferveu em 2008 (com as hipotecas subprime), e continua cozinhando em banho-maria, ocorreu justamente por conta da excessiva e pródiga oferta de financiamento ao setor privado. Será realmente fantástico se esses prolíficos Bancos Centrais conseguirem curar a já enferma economia, evitando problemas e efeitos colaterais ainda piores mais adiante, usando aquele mesmo veneno que já quase matou o doente: uma grande oferta de dinheiro!
Se forem bem sucedidos, esses gênios financeiros estarão provando que a teoria de Einstein mais uma vez falhou em sua lógica. Afinal, o físico já havia dito que "não é possível solucionarmos nossos problemas adotando o mesmo raciocínio que usamos quando os criamos!"
Esperemos para ver quem vai pagar esse pato...
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