Reforma Tributária: Primeiras Impressões

 | 28.06.2021 10:53

O fim de semana foi ocupado com estudos e conversas a respeito da proposta de reforma tributária enviada na sexta-feira. Muito divertido.

A leitura ainda é preliminar e muita discussão precisa acontecer. Nuances e cálculos mais aprofundados hão de ser feitos. Peço a gentileza de que os comentários aqui registrados sejam recebidos com parcimônia e ciência por se tratar ainda de uma primeira avaliação.

Essa é uma proposta inicial do governo, que, curiosamente, contraria as intenções originais do próprio governo para essa reforma tributária, ensejando, assim, espaço para modificações importantes até sua real implementação. Mesmo se não fosse o caso, já haveria relevante debate e possível modificação no Legislativo, de tal sorte que interpretações mais inflamadas neste momento precisam ser evitadas.

Pondero ainda que há elementos positivos na proposta. Seu caráter ambivalente, portanto, torna difícil, para algumas situações particulares, inferir a real força resultante.

Ressalvas feitas, considero, no geral, a proposta ruim e defendo uma necessidade de mudanças. Cabe à própria sociedade civil apontar caminhos e pressionar por eles.

Os objetivos originais desta fase da reforma, dentro do Ministério da Economia e mesmo por aqueles que estavam envolvidos na redação da lei, eram, sobretudo, reduzir a “pejotização” (aquele seu amigo jornalista que cria uma empresinha ou o conhecido advogado que ganha sob a forma de dividendos), simplificar a estrutura tributária, garantir maior isonomia e evitar aumento de carga tributária — há razoável consenso de que empresas sob o lucro real no Brasil já pagam bastante imposto.

Vejo alguns problemas.

O escalonamento da redução do Imposto de Renda Pessoa Jurídica a partir de 2022, supostamente a ser contrabalanceado pela reintrodução da tributação de dividendos e pela eliminação da dedutibilidade de juros sobre capital próprio, na verdade, implica aumento de carga tributária, ferindo um dos objetivos originais da propostas. Ao combater a pejotização (o que me parece uma ideia legítima e apropriada), introduz-se de maneira imediata uma alíquota de 20% sobre dividendos, retida na fonte; enquanto isso, a proposta reduz a alíquota de IRPJ de maneira gradativa e não proporcional. 

Cumpre também observar que, embora a taxação de dividendos já estivesse em grande medida incorporada ao consenso de mercado, falava-se numa alíquota de 15% (e não de 20%), conforme acabou sendo aproveitado. 

Abaixe o App
Junte-se aos milhões de investidores que usam o app do Investing.com para ficar por dentro do mercado financeiro mundial!
Baixar Agora

Outro ponto importante se refere à falta de isonomia entre os fundos imobiliários, cujos rendimentos passam a ser tributados, e LCIs e LCAs. Como, em grande medida, os FIIs representam investimentos diretos e também são fonte importante de financiamento para a indústria, de forma semelhante às letras de crédito, não parece razoável tributá-los, deixando os demais instrumentos isentos. Essa é uma surpresa negativa relevante da proposta (a notícia boa é que a indústria já se mobiliza fortemente e há chances efetivas de que isso acabe caindo).

Existem também pontos positivos da reforma. A tributação em Bolsa passa de mensal para trimestral, com alíquota geral de 15%; a taxação de fundos fechados é uma medida justa, já bastante aguardada e que caminha na direção da unificação da tributação dos instrumentos financeiros; o valor de bens imóveis poderia ser atualizado, sendo devida a alíquota de 5%, o que pode significar antecipação de receita tributária para o governo e maior facilidade para alienação imobiliária pelas pessoas físicas; e, claro, a atualização da faixa isenta, que representa um impulso na veia da renda líquida de famílias de renda mais baixa.

Em termos de impacto no preço dos ativos, o pensamento de primeiro nível sugeriria uma migração de casos de value, tipicamente associados a mais pagamento de dividendos, para casos de growth e para outros instrumentos pagadores de renda, como as NTN-Fs e as Bs com cupom; além da perspectiva de pior performance relativa de nomes que usualmente pagam bastante juros sobre capital próprio, como Ambev (SA:ABEV3) e Vivo (SA:VIVT3). 

Contudo, eu tomaria um pouco de cuidado com essa leitura. As pessoas (e as empresas) reagem a incentivos. Não me surpreenderia se as companhias com reserva de lucro acelerassem dramaticamente suas distribuições de proventos, alavancassem seus balanços e passassem a fazer muito mais recompra de ações posteriormente. O sujeito “shorteia” uma boa pagadora de dividendo e acorda com a notícia de um dividendo extraordinário de dois dígitos.

Chamaria a atenção para os fundos imobiliários. Aqui pode já haver uma oportunidade de compra interessante. Não douremos a pílula. Não é um “screaming buy” clássico, porque envolve risco. A notícia de tributação, tal como colocada, é ruim e poderia trazer uma correção de valores justos entre 5% e 10%. Alguns já caíram 3-4% na sexta-feira. Como é um mercado de pessoa física e sem muita liquidez, os movimentos não são tão instantâneos e seria razoável esperar queda adicional de 2-3% hoje. 

Entretanto, há ponderações importantes. O mercado já vinha fraco nas últimas semanas, tornando alguns FIIs bem atraentes. Com a queda de sexta, alguns bons fundos de tijolos já oferecem yield entre 7% e 8%, o que era impensável há pouco tempo — não à toa, alguns FIIs já diminuíram suas quedas perto do final do pregão de sexta, com investidores institucionais (aqueles com caixa) aproveitando a queda para reforçar posição. 

Existem boas chances de que essa tributação dos rendimentos dos FIIs não seja aprovada. Essa é uma indústria ainda incipiente no Brasil, cuja tributação deveria, por isonomia, ser semelhante àquela de LCIs e LCAs, pois representa investimento direto, e representa uma classe importante de ativos na B3 (SA:B3SA3), com cerca de 1,5 milhão de investidores. A indústria já está fortemente mobilizada e, mais do que isso, como envolve riscos de mudança para os FIIs agro, a medida pode atrair a atenção da bancada ruralista, tradicionalmente bastante vocal e organizada.

Em termos da matriz de payoff, ponderando riscos e retorno potencial, já parece fazer sentido adicionar alguns FIIs na carteira, em especial se considerarmos a chance de não aprovação desse tópico.

A capacidade de separar ruído de sinal será sempre o principal ativo do bom investidor.

Negociar instrumentos financeiros e/ou criptomoedas envolve riscos elevados, inclusive o risco de perder parte ou todo o valor do investimento, e pode não ser algo indicado e apropriado a todos os investidores. Os preços das criptomoedas são extremamente voláteis e podem ser afetados por fatores externos, como eventos financeiros, regulatórios ou políticos. Negociar com margem aumenta os riscos financeiros.
Antes de decidir operar e negociar instrumentos financeiros ou criptomoedas, você deve se informar completamente sobre os riscos e custos associados a operações e negociações nos mercados financeiros, considerar cuidadosamente seus objetivos de investimento, nível de experiência e apetite de risco; além disso, recomenda-se procurar orientação e conselhos profissionais quando necessário.
A Fusion Media gostaria de lembrar que os dados contidos nesse site não são necessariamente precisos ou atualizados em tempo real. Os dados e preços disponíveis no site não são necessariamente fornecidos por qualquer mercado ou bolsa de valores, mas sim por market makers e, por isso, os preços podem não ser exatos e podem diferir dos preços reais em qualquer mercado, o que significa que são inapropriados para fins de uso em negociações e operações financeiras. A Fusion Media e quaisquer outros colaboradores/partes fornecedoras de conteúdo não são responsáveis por quaisquer perdas e danos financeiros ou em negociações sofridas como resultado da utilização das informações contidas nesse site.
É proibido utilizar, armazenar, reproduzir, exibir, modificar, transmitir ou distribuir os dados contidos nesse site sem permissão explícita prévia por escrito da Fusion Media e/ou de colaboradores/partes fornecedoras de conteúdo. Todos os direitos de propriedade intelectual são reservados aos colaboradores/partes fornecedoras de conteúdo e/ou bolsas de valores que fornecem os dados contidos nesse site.
A Fusion Media pode ser compensada pelos anunciantes que aparecem no site com base na interação dos usuários do site com os anúncios publicitários ou entidades anunciantes.

Sair
Tem certeza de que deseja sair?
NãoSim
CancelarSim
Salvando Alterações