SPIVA Scorecard: o documento que gestores de fundo não querem que você conheça

 | 20.12.2022 16:45

Apesar de todo o folclore envolvendo investimentos, o melhor caminho para quem cuidar do seu dinheiro é o mesmo de tantas outras áreas: acompanhar aquilo que a ciência recomenda. No caso desse texto, vamos conhecer um pouco mais do SPIVA Scorecard, documento que registra e compara, duas vezes por ano, a performance de fundos de investimento contra índices de investimento passivos – algo que os próprios fundos fazem ao sabor da própria conveniência.

Dito de forma simples e direta, os resultados são brutais para as gestões de fundos de investimento – tanto os de renda variável quanto de renda fixa. Ao compararmos os resultados de cinco e dez anos, terminados em junho de 2022, cerca de 78% e 88% dos fundos de renda variável foram superados pelo índice S&P Brazil BMI.

O mesmo princípio se aplica a fundos que investem com foco em prêmios historicamente documentados, como aqueles de empesas de baixa capitalização de mercado, as populares small caps. No caso, para os períodos de cinco e dez anos, 89% e 87% dos fundos com foco nessas empresas foram superados pelo S&P Brazil MidSmall Cap, que reúne passivamente um cesto dessas ações.

Quando mudamos o foco da renda variável para a renda fixa, os resultados continuam sendo péssimos para fundos. Em períodos de cinco e dez anos, 94% e 92% deles obtém rendimentos inferiores ao Índice de Debêntures Anbima (IDA-Geral), composto apenas por títulos de dívida corporativa. Nos mesmos períodos, 79% e 87% dos fundos focados em dívida pública (títulos do Tesouro Nacional) rendem menos que o Índice de Mercado Anbima (IMA).

h2 Retornos ajustados por risco não ajudam muito/h2

Ao ajustarmos os retornos obtidos por fundos em relação aos riscos específicos a que se expõem no mercado, o cenário da renda variável quase não muda. Para períodos de cinco e dez anos, 78% e 87% dos fundos de renda variável produzem retornos inferiores ao índice S&P Brazil BMIPara fundos focados em small caps, os retornos de 89% e 87% dos fundos, em cinco e dez anos, são inferiores ao índice Brazil MidSmall Cap.

Há uma melhora mais significativa quando tomamos o caso da renda fixa, com 82% e 71% deles produzindo retornos ajustados ao risco superiores aos do IDA-Geral em períodos de cinco e seis anos. No caso dos fundos focados em títulos do tesouro, os percentuais ficam bem mais aceitáveis, com 53% e 58% deles obtendo rendimentos mais altos que o IMA-Geral calculado pela Anbima.

h2 Por que fundos tem performances tão ruins?/h2
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Há algumas décadas sabemos que não há razão para acreditar que equipes de gestão sejam capazes de superar o retorno médio dos mercados, e a ciência tem uma explicação bastante boa para isso. Um bom índice de mercado representa, de forma agregada, as convicções e posições de todas as partes que atuam no mercado, pois todas as operações realizadas afetam o preço dos ativos – sejam ações, títulos corporativos ou públicos.

Na medida em que o preço reflete a perspectiva de retorno futuro de um ativo, e que existe uma gama gigantesca de informações surgindo sem parar, a média do mercado se atualiza a todo momento. O resultado disso é que um bom índice, como o S&P Brazil BMI ou o IBRX, que reúne as 100 maiores empresas por capitalização de mercado, é extremamente difícil de ser superado.

Isso porque, para ter uma performance mais alta de forma consistente, uma equipe de gestão precisa estar mais correta que o consenso que é construído pelo mercado inteiro, e precisaria fazer isso na maior parte do tempo. Para deixar as coisas um pouco mais difíceis, precisa fazer isso cobrando uma taxa de administração que não consuma o retorno adicional que, nesse caso, seria produzido.

No caso da renda variável, temos alguns problemas adicionais. O mercado de ações possui algumas características notáveis, que são a concentração de retornos em um número muito pequeno de ações, em períodos muito específicos. De resto, a esmagadora maioria das ações tem performances negativas ou que simplesmente coincidem com um ativo considerado livre de risco, como títulos do Tesouro Nacional. 

Por outro lado, se você quer ter retornos acima da média, vai necessariamente precisar de uma carteira que possua uma composição diferente da média para poder ter acesso a um eventual retorno mais alto. Quanto mais diferente essa composição, maior a chance de um retorno mais alto, que como vimos acima não será muito alta e nem muito significativa. Tal como no cassino, as chances estão brutalmente contra você.

h2 A triste matemática das taxas/h2

Como vimos, a capacidade de produzir retornos acima da média, especialmente na renda variável, são muito baixas. Entretanto, são justamente nesses casos em que as taxas são as mais absurdas. Para quem não tem familiaridade com o mercado financeiro, um fundo de ações costuma cobrar taxas de 2% ao ano e uma taxa adicional de 20% sobre os retornos que excederem o Ibovespa, que figura como referência para o mercado acionário nacional.

Vamos ignorar o Ibovespa, que é um índice de negociação, e usar como referência o IBRX, que tem composição similar ao S&P Brazil BMI e reflete, com efeito, o mercado acionário brasileiro. Com isso em mente, a equipe de research da Portfel Consultoria produziu um gráfico com os rendimentos desse índice ao longo de dez anos. Junto a ele, foram inseridos os rendimentos obtidos caso pagássemos uma taxa de 2% (praticada por fundos) e de 0,2% ao ano, praticada por um ETF facilmente adquirido em bolsa.