Hora do Gráfico - BRFS3: Abílio, Segura Peão!

 | 16.02.2018 16:07

Operar no setor de alimentos é algo bastante complicado. Para quem estuda (ou estudou) economia sabe que os gráficos de oferta e demanda nos alimentos é um dos que mais variam.

E explico o motivo. Apesar do fato do brasileiro ser um consumidor ávido, no setor de carnes em geral os produtos são muito voláteis e seguem muito de perto as variações de inflação quando com a subida dos preços as classes mais baixas (C e D) alteram seu consumo de carnes mais caras (bovina) e vão “descendo” na escala de consumo de proteínas passando para alimentos mais baratos como frango, porco e por fim ovos.

Qualquer estresse econômico que jogue os preços lá para cima impacta rapidamente os hábitos de consumo.

Se observarmos o gráfico de consumo nacional de proteína, veremos que a partir de 2008/2009, ou seja, o estouro da crise mundial o padrão de proteína na mesa do brasileiro alterou-se de carne para frango. Repare que o de suínos também subiu.

Consumo de proteínas - Brasil


Mas se isso parece ruim por um lado, onde empresas que trabalham majoritariamente com um segmento (como a JBS (SA:JBSS3 (SA:JBSS3)) por exemplo) são prejudicadas, por outro nós podemos aproveitar uma empresa que agregue todos (ou a maior parte) os itens dessa escala. Estamos falando da Brasil Foods (SA:BRFS3) (SA:SA:SA:SA:SA:SA:BRFS3) meus amigos...

Brasil Foods, um fracasso que virou um sucesso!

Para não perder muito tempo nessa parte, mas ainda assim para relembrar ou informar um desavisado aqui ou ali, vale a pena dar uma passada de pano na história da empresa.

Após um desastroso ano de 2008, em pleno crash da economia norte americana e início da crise mundial, a Sadia vivenciou a sua pior crise financeira após uma série de apostas mal realizadas no mercado de derivativos cambiais.

O que se falava até então é que a Sadia estava pronta para adquirir a Perdigão, sua principal concorrente, mas depois de registrar um prejuízo de 2.5 BILHÕES no ano, as coisas se inverteram e os controladores da Sadia pediram arrego... Foi quando a Perdigão deu a volta por cima e arquitetou a fusão de ambas as marcas sob uma única empresa. Nascia assim a BRF.

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E a empresa já nasceu gigante. Com mais de 120 mil funcionários espalhados no Brasil e no mundo, mais de 40 instalações e um faturamento anual de R$ 22 Bilhões (hoje em mais de 35 bi), a nova empresa figurava entre as Top 10 empresas do continente americano.

E no começo tudo parecia ir de vento em polpa!

Dito isso, os investidores se mostraram otimistas com o futuro da empresa e isso (como sempre) se refletiu nas ações da companhia:


LTA - BRFS3

Ah, foram seis lindos anos de amizade que deram certo para todo mundo.

A empresa expandia as suas operações no Brasil e no exterior agressivamente para realizar um maior mix de clientes e focar na exportação de produtos industrializados para países e regiões como Argentina (adquiriu a Quick Foods, dona da marca Paty), Oriente Médio (adquiriu 49% da Federal Foods) e Ásia com Hong Kong e Macau (fez parcerias com a empresa chinesa Dah Chong Hong).

Tudo parecia estar indo de acordo com os conformes, mas havia uma pedra no meio do caminho. Uma pedra não, um meteoro!

2016, o ano da virada (para baixo)!

Eu particularmente evito trabalhar com empresas como a BRF, a Mafrig e a Minerva (SA:SA:SA:SA:SA:SA:BEEF3), ou seja, empresas de alimentos e isso porque elas estão condicionadas a coisas que fogem muito do controle e das previsões humanas: o clima.

Ora, se a matéria prima da BRF é proteína animal (carne, frango e suíno) e estes tem seus ciclos de criação próprios, qual o mínimo denominador comum destes quando estamos avaliando custos produtivos? A resposta é ração... a resposta é COMMODITIES.


Pegando o custo da ração (em dólar USD) entre os períodos de Dez/13 a Dez/16 nós temos que dado o clima positivo em 14 e 15, ambos anos favoráveis para a agricultura, o custo produtivo do animal apresentou redução, ficando em um patamar estável por cerca de dois anos.

Mas para o meio de 2015 foi se formando a expectativa de que 2016 seria um ano de El Niño (clima desfavorável para soja/milho). A confirmação do El Niño se dá quando há aumento de temperaturas nas leituras trimestrais, devendo o clima ficar +0.5ºC por cinco trimestres consecutivos. E isso foi confirmado ao longo de todo 2015:


(Para entender melhor o que El Ninõ e La Ninã clique aqui )

Com um cenário pior para Soja/Milho, os custos começaram a ser reajustados para cima e os preços das rações dispararam novamente (farelo de soja, um dos principais compostos para rações, subiu quase 39% ano sobre ano). E para quem não sabe, o custo para se criar frango e porco é basicamente ração...


Apesar do mercado mundial como um todo ter sofrido com o El Niño, os países da América Latina como Brasil e Argentina tiveram grandes quebras de safras e com isso o preço interno da soja e milho disparou, deixando as empresas por aqui em posição desfavorável de preços quando foi necessário repassar estes aos consumidores.

Porém, dada a demanda fraca e o consumo em queda frente a elevada inflação em 2016 (lembra do gráfico lá em cima), as empresas como a BRF ficaram de mãos atadas em repassar integralmente o aumento de custos ao consumidor final, tendo a sua margem esmagada:



Para piorar, com o custo elevado as nossas exportações ficaram pouco competitivas com outros pares internacionais, levando a uma queda de -11% no total exportado.

Dado uma série de contrapontos e desarranjos dentro e fora da BR Foods, o resultado disso é possível se ver no quadro abaixo, onde podemos acompanhar o lucro líquido e a geração EBITDA da companhia:

Menor geração de caixa leva as empresas a o que? A se endividar para girar as suas operações, é claro! Entre os anos de 2015 e 2016 a BRF viu seu endividamento líquido (já exclusos disponibilidades) subir vertiginosamente de R$ 6.2 Bi no 1Tri/15 para R$ 11.1 Bi no 4Tri/16 com uma alavancagem passando de 1,26x para 3,25x no mesmo período.

Tivemos com isso uma resposta do mercado, onde os papéis iniciaram sua lenta e contínua perda de valor, revertendo a sua antiga LTA até então, conforme é possível ver no gráfico abaixo:

Hora do Gráfico - Abílio, segura peão!

Nas famosas Ondas de Dow, um papel no mercado possui três grandes movimentos, sendo eles: i. Uma linha de tendência de alta/baixa, ii. Uma reversão temporária dessa tendência e iii. Retomada da tendência de alta/baixa anterior dando continuidade ao movimento maior.

E foi o que muitos pensaram ter ocorrido no final de 2015, quando o papel entrou em um breve movimento corretivo, esperando-se que logo mais a tendência anterior de alta fosse mantida. Ledo engado.

Ao contrário do que nos diz Dow, os papéis da BRF reverteram para uma LTB (linha de tendência de baixa) e depois disso foi só ladeira abaixo. O papel saiu do patamar de R$ 76,00 para próximos dos R$ 33,00 atualmente. Uma queda de mais de -55%!!!

As atenções todas se viraram para o seu frontman midiático Abílio Diniz, o mega empresário de sucesso que havia adentrado no conselho da BRF no fim de 2013 com a promessa de torna-la uma campeã, não apenas nacional, mas mundial.

Mas o que se esperava de seu chairman (Abílio) e do então presidente da companhia Pedro Faria, este segundo recomendado pela acionista Tarpon (SA:SA:SA:SA:SA:TRPN3) e fortemente apoiado pelo próprio Diniz, não foi concretizado. Pelo contrário, houveram sucessões de erros estratégicos e operacionais, dentre eles:

1) Não entender o setor:

Esse foi o principal erro da nova gestão Diniz/Faria. Acostumados a empresas do setor de varejo e consumo, ambas com uma dinâmica bem diferente das empresas industriais (como é a BRF), a nova administração tentou impor velhas estratégias de sucesso em outros setores em um ramo que não cabia.

O maior equívoco feito foi quando a administração impôs a redução brusca dos estoques de rações para a criação de suínos e aves a fim de manter por maior tempo possível o dinheiro em caixa para aumentar o fluxo de caixa e não em estoques.

Resultado disso? O preço das rações disparou (como visto lá em cima) e a BRF estava com estoques baixíssimos para alimentar os animais. A consequência foi ter gastos maiores com aquisição de ração quando estas estavam em valores recordes de alta. Isso impactou fortemente os fluxos de caixa da empresa, o que gerou os consecutivos prejuízos.

2) Rosto novo, tudo novo:

O erro observado no item 1 é diretamente decorrente do erro número 2. Com a entrada de Abílio, o mega empresário decidiu que era hora de dar uma repaginada na equipe de gestão da BRF.

Com isso, foram demitidos funcionários chave que estavam há décadas na empresa e conheciam o fluxo de operações do setor. Em seus lugares, foram trazidos para a gestão conhecidos de Diniz que estavam acostumados a outros setores (como o de fast-foods ou cervejeiros).

A falta de experiência destes no setor da BRF aliado à visão equivocada de tentar transformar a empresa em uma Ambev (SAABEV3), por exemplo, levou a decisões (como a citada no ponto 1) equivocadas que pessoas experientes no setor jamais cometeriam.

Para piorar, antigos funcionários da BRF foram absorvidos pelas concorrentes, como a JBS que além de contratar funcionários com alta experiência, tiveram acesso a informações trazidas por estes funcionários.

3) Revolucionar o que não precisa ser revolucionado:

Você conhece o ditado em que diz “time que está ganhando não se mexe”? Pois é. O Abílio parece não conhecer!

Historicamente Sadia e Perdigão (ambas da BRF após a fusão) eram concorrentes diretas no mercado de alimentos processados. Com preços muito próximos, a diferenciação estava mais no paladar do consumidor do que no preço da gôndola nos supermercados.

Pensando nisso, a BRF decidiu que iria reposicionar suas marcas. O plano era transformar a Sadia em uma marca premium com um marketing agressivo, enquanto que usaria a Perdigão como marca da classe média (C e inferiores). Dessa forma, os preços da Sadia foram aumentados em média 20% e os da Perdigão foram mantidos no patamar anterior.

O problema é que os consumidores não compraram a ideia da Sadia como uma marca da classe B e A e não aceitaram bem o aumento dos preços. Além disso, os concorrentes que atuavam em preços menores que a Perdigão subiram seu valor para o mesmo patamar e começaram a concorrer diretamente com a marca.

Resultado disso... a Sadia perdeu consideravelmente o seu antigo mercado de atuação (além de não angariar quase nada da nova classe que pretendia) e a Perdigão também viu seu market-share derreter com os concorrentes atacando sua fatia de mercado:


Está ai agora explicado o porquê da tamanha queda. Mas será que já acabou?

BRFS3 – Vem chumbo grosso por ai!

Às vezes achamos que já chegamos ao fundo do poço, mas depois vemos que é possível descer mais! E parece esse ser o caso da BRFS3.

Desde o começo de 2017 os papéis apresentaram um desenho bem nítido de LTB (linha de tendência de baixa) sem qualquer sinal de reversão para alta. A porrada veio forte ao longo de todo o primeiro trimestre (linha A). A queda entre o 4Tri/16 e o 1Tri/17 foi de aproximadamente -40%.



O papel até chegou a ensaiar alguma reação no segundo trimestre de 2017, mas não teve força suficiente para manter o movimento. Após uma alta em torno de 25% as ações entraram em uma janela de vendas (janela B) com o MACD cruzando a Signal para baixa e o Histograma entrando em campo negativo, demonstrando que a queda seria feia. O papel voltou ao patamar anterior dos R$ 35,00.

O movimento se repetiu meses depois quando voltou aos R$ 50,00 e o que pareceu ser a retomada da BRFS3, provou-se ser um dos sinais mais temidos pelos analistas grafistas no mercado. Estávamos enxergando um possível OCO (ombro-cabeça-ombro).

O alarme foi acionado e as atenções se voltaram ao próximo movimento de alta que estava previsto para os papéis, comprovando o segundo ombro e decretando a baixa forte esperada para depois.

Mas nem isso foi necessário esperar!

Com um 3Tri/17 decepcionante, prejuízos reportados, perda de margens, aumento de alavancagem e menor volume de vendas, os papéis amargaram um forte movimento de baixa e vem desde então (análise feita em 14-Fev-17) apontando para mais quedas.

O papel já tocou a casa dos R$ 30,00 e parece ter encontrado ali um suporte temporário á espera dos números fechados de 2017 que podem dar alguma força à uma recuperação, ou decretar de vez o pessimismo com a empresa.

BRFS3 – O QUE ESPERAR DO FUTURO?

Segundo análises das principais casas de mercado, espera-se que a BRFS3 apresente um resultado negativo no 4Tri/17 e no consolidado anual. Os números refletem ainda os erros do biênio 2015/16 que vem sendo carregados até então.

Pelo lado positivo, temos o cenário favorável para commodities e, consequentemente, para rações, o que pode ajudar a margem operacional da companhia com a redução de custos:

Os custos com rações no Brasil caíram vertiginosamente em 2017 com super safras de milho e soja, tendo o país fechado com um dos menores custos para criação no período. Com isso, a margem para os produtores voltaram a subir e ficaram acima das médias históricas.

Com isso esperam-se números ruins, sim, mas menos piores do que nos trimestres anteriores.

Bons investimentos!

Publicação original: Hora do Gráfico – BRFS3

DISCLAIMER: ISTO É APENAS UM COMENTÁRIO SOBRE ANÁLISE TÉCNICA E NÃO CONSTITUI NENHUMA ESPÉCIE DE ACONSELHAMENTO FINANCEIRO.

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