Tônica da Semana: Economia e Mercado São Coisas Diferentes

 | 06.07.2020 12:08

O título da tônica dessa semana parece óbvio, mas tenho escutado muito a respeito da aparente dissociação entre economia e mercado. Aquela ideia de que os preços de ativos (em especial ações) não condizem com o momento econômico vivido. Não preciso discorrer sobre os motivos (entenda-se corona), mas é um fato que temos desemprego alto, PIB em baixa, empresas quebrando e outros vários receios – aumento da inadimplência de famílias e empresas, insolvência fiscal do país, desarranjo político e por aí vai.

Mas é importante que o leitor e investidor saiba separar as coisas.

h5 (i) UMA COISA É UMA COISA, OUTRA COISA É OUTRA COISA/h5

Me desculpem a expressão chula, mas por vezes elas caem como uma luva aquilo que você quer explicar. Mercado e economia são como aquela expressão: “não confunda c* com bunda!”. Sim, estão perto um do outro; sim, andam juntos; sim, você não consegue separá-los…mas não são a mesma coisa! Vou citar aqui alguns fatores que são muito mais conectados a mercado.

Fluxo. Temos falado exaustivamente disso aqui nas últimas semanas…o que tem segurado e muito o mercado é a entrada de mais e mais pessoas/agentes no mercado. São os órfãos do CDI ou treasury nos EUA. Fundos de pensão, investidores, fundos, empresas, etc. O mercado é regido sob a égide da oferta e demanda. Mais pessoas demandando a um dado nível de oferta… BINGO! Temos aumento de preços.

Sentimento. O mercado é deveras influenciado por sentimentos no curto prazo. Inclusive, nos EUA temos dois acrônimos para descrever isso. FOMO – fear of missing out –, que na tradução seria algo como “medo de ficar de fora da festa”, em que investidores vendo preços subindo e notícias de ganhos aqui e acolá, saltam para o mercado para não perder tais ganhos. Outro acrônimo é o TINA – there is no alternative – slogan da Margaret Thatcher na década de 80 que hoje serve bem para explicar uma maior alocação em ativos de risco num cenário de taxas de juros tão baixas para outros ativos.

Valuation. Já comentei aqui em outra tônica sobre isso. Recapitulando: qualquer conta de valor justo de uma ação leva em conta o valor do dinheiro ao longo do tempo. Isso é resolvido através do uso de uma taxa de desconto. Pode ser por fluxo de caixa descontado, multiplo justos, gordon etc. Todos trazem fluxos futuros para o presente, descontados por uma taxa. Vejamos um exemplo de uma empresa que tem um ROE de 20%, cresce lucros a 7% aa. Considerando uma taxa de desconto de 15% , 12% ou 9%. Qual o múltiplo price-to-book (P/VPA) dela? Simples! P/B= (ROE – g) / (r-g)

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A 15% temos: (0.2 – 0.07) / (0.15 – 0.07) = 1.63x

A 12% temos: (0.2 – 0.07) / (0.12 – 0.07) = 2.60x

A 9% temos: (0.2 – 0.07) / (0.09 – 0.07) = 6.50x

Diferentes taxas de desconto me levam a diferentes múltiplos justos! O mesmo vale para um calculo simples de um fluxo de dividendos de US$1 que cresce 5% aa, descontado por diferentes taxas.

A 15% temos: (1.o) / (0.15 – 0.05) = preço justo $10

A 12% temos: (1.0) / (0.12 – 0.05) = preço justo $14.3

A 9% temos: (1.0) / (0.09 – 0.05) = preço justo $25

O que estou querendo dizer com isso? Simples: se o mercado assume que a “nova” taxa de desconto para um determinado ativo é mais baixa… BINGO! Temos mais upside nele!

Então esses são três fatores de mercado que tem menor relação com as notícias que lemos por aí, de PIB em baixa e lockdown, e que ajudam a entender as altas atuais.

h5 (ii) INDICADOR QUE INDICA ALGO /h5

Sim, a economia é importante para o mercado, mas não é “o mercado”! Em mercado financeiro o que realmente importa são os chamados leading indicators – dados antecedentes que ajudam a ler o futuro da economia. A meu ver aqui que as coisas ficam bem turvas, porque nem sempre a indicação dada por um indicador macro garante um resultado no futuro e isso causa erros de interpretação. Mas é o jeito que o mercado olha! Nesse sentido, vou dar aqui uma pequena contribuição olhando alguns indicadores que me chamam a atenção.

Dados de emprego nos EUA têm mostrado uma forte recuperação, o que é positivo e refuta a ajuda a fomentar certo otimismo com a economia … no futuro. Se por um lado a crise gerou 22MM de desempregados, em dois meses foram “recriados” 7.5MM de empregos surpreendendo a todos considerando que a economia ainda está em certo lockdown.