ENTREVISTA: 'Juro a 2% é insustentável, mas não se sabe como o BC sai da arapuca'

Estadão Conteúdo

Publicado 29.10.2020 04:24

Atualizado 29.10.2020 08:31

'Juro a 2% é insustentável, mas não se sabe como o BC sai da arapuca'

A manutenção dos juros básicos no patamar historicamente baixo de 2% ao ano, pelo Comitê de Política Monetária (Copom), demonstra que o Banco Central caiu em uma armadilha: o mercado apostou em uma recuperação mais lenta da economia após o pior da pandemia da covid-19 e em uma inflação mais baixa. Essa é a avaliação de Luiz Carlos Mendonça de Barros, que foi presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e ministro das Comunicações. "O BC ficou com uma batata quente nas mãos, com inflação prevista para mais de 3% no ano que vem. BC e mercado erraram, mas não esperem um pedido de desculpas." Para o economista, a taxa Selic é insustentável no patamar atual e deve voltar a subir, para um nível próximo a 3,5% ao ano, seguindo as previsões de inflação para o ano que vem. A seguir, trechos da entrevista.

REPERCUSSÃO: BC mantém Selic em 2%, reconhece pressão inflacionária, mas deixa porta aberta para corte

Como avaliar a manutenção dos juros em 2%?

Há uma armadilha muito grave para o Copom. O Banco Central acreditou nas previsões que o mercado fez, há quatro ou cinco meses, para a inflação deste ano e do ano que vem. O mercado errou, a expectativa era de 2% para este ano e, mesmo para o ano que vem, era baixa, entre 2% e 2,5%. O BC levou isso a ferro e fogo, sem criticar. E agora o mercado mudou a expectativa de inflação, para mais de 3% em 2021, sem pedir desculpas ao BC. Agora, eles estão com uma batata quente nas mãos. Isso é um problema: o protocolo do sistema de metas de inflação usa a inflação do mercado.

Foi um erro de previsão?

O sistema de metas manda usar as estimativas de mercado para olhar para frente. E as expectativas eram essas no Relatório Focus. Em março e abril, as previsões de inflação eram baixas. Teve até quem propusesse colocar os juros em 1,5% ao ano. Mas, implicitamente, se dizia que a recuperação da economia seria mais lenta do que está sendo. Esse foi o erro. A recuperação foi mais forte, o câmbio jogou mais lenha na fogueira e o BC ficou atrasado. A Selic é menor do que a expectativa de inflação.

A Selic deveria ser maior?

Estamos com 2% ao ano de Selic, com perspectiva de manter isso para o ano que vem, enquanto a perspectiva de inflação para 2021 agora é bem mais alta. O Banco Central deveria reconhecer que errou e que o mercado errou também.

LEIA MAIS: Mercado Acentua Percepção do Cenário Tido Como Promissor, e a Realidade é Outra no Pós-Copom!

O mercado e o BC não conseguiram avaliar a velocidade de recuperação após o pior da pandemia, em abril?

Tenho muito receio desses protocolos rígidos. Em momentos de crise, você acaba apostando em um cenário futuro que não é verdadeiro. Eles apostaram que a retomada seria muito lenta, mas há segmentos da indústria que hoje estão a plena carga, com inflação de demanda e de falta de produtos. O que fazer agora? Quando eu era diretor do BC, nos anos 80, vi um exemplo claro disso: foi publicada uma circular e alguns dias depois se percebeu que estava errada. Ficou a discussão, se mudava ou não. Alguns técnicos disseram que, se o BC reconhecesse o erro, perderia a credibilidade. O então presidente do banco, Fernão Bracher, arbitrou da seguinte forma: é preferível passar vergonha hoje do que conviver com o erro por muito tempo. É a situação de agora.

Abaixe o App
Junte-se aos milhões de investidores que usam o app do Investing.com para ficar por dentro do mercado financeiro mundial!
Baixar Agora

Quais são as outras opções?

Se a expectativa de inflação para 2021 ficar em 3,5%, ele precisará elevar os juros para perto de 3,5% e o mercado já está prevendo esse movimento de alta. Tem uma recuperação mais forte, uma pressão do câmbio e uma escassez de oferta. É preciso subir juros.

Os juros básicos no patamar atual são insustentáveis?

É insustentável ter os juros a 2%, mas não se sabe como o BC vai sair dessa arapuca. Não adianta aumentar 0,15 ponto porcentual, ele vai ter de dizer no "forward guidance" (prescrição futura) que errou tanto a intensidade da recuperação quanto a inflação futura. A lição é que todo protocolo para ação macroeconômica do governo precisa ter uma base analítica correta. Mais do que isso, se errou, corrige. Já deveria ter corrigido. Vão jogar a culpa na questão do déficit público, mas isso não tem nada a ver.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Negociar instrumentos financeiros e/ou criptomoedas envolve riscos elevados, inclusive o risco de perder parte ou todo o valor do investimento, e pode não ser algo indicado e apropriado a todos os investidores. Os preços das criptomoedas são extremamente voláteis e podem ser afetados por fatores externos, como eventos financeiros, regulatórios ou políticos. Negociar com margem aumenta os riscos financeiros.
Antes de decidir operar e negociar instrumentos financeiros ou criptomoedas, você deve se informar completamente sobre os riscos e custos associados a operações e negociações nos mercados financeiros, considerar cuidadosamente seus objetivos de investimento, nível de experiência e apetite de risco; além disso, recomenda-se procurar orientação e conselhos profissionais quando necessário.
A Fusion Media gostaria de lembrar que os dados contidos nesse site não são necessariamente precisos ou atualizados em tempo real. Os dados e preços disponíveis no site não são necessariamente fornecidos por qualquer mercado ou bolsa de valores, mas sim por market makers e, por isso, os preços podem não ser exatos e podem diferir dos preços reais em qualquer mercado, o que significa que são inapropriados para fins de uso em negociações e operações financeiras. A Fusion Media e quaisquer outros colaboradores/partes fornecedoras de conteúdo não são responsáveis por quaisquer perdas e danos financeiros ou em negociações sofridas como resultado da utilização das informações contidas nesse site.
É proibido utilizar, armazenar, reproduzir, exibir, modificar, transmitir ou distribuir os dados contidos nesse site sem permissão explícita prévia por escrito da Fusion Media e/ou de colaboradores/partes fornecedoras de conteúdo. Todos os direitos de propriedade intelectual são reservados aos colaboradores/partes fornecedoras de conteúdo e/ou bolsas de valores que fornecem os dados contidos nesse site.
A Fusion Media pode ser compensada pelos anunciantes que aparecem no site com base na interação dos usuários do site com os anúncios publicitários ou entidades anunciantes.

Sair
Tem certeza de que deseja sair?
NãoSim
CancelarSim
Salvando Alterações