Mais suave, café arábica pode ganhar fatia no consumo no Brasil após disparada do conilon

Reuters

Publicado 23.06.2023 13:32

Por Roberto Samora

SÃO PAULO (Reuters) - O café arábica, considerado mais suave e adocicado, provavelmente vai recuperar na temporada 2023/24 alguma participação perdida na composição do "blend" do produto torrado e moído vendido aos consumidores brasileiros, na avaliação de analistas.

Isso pode acontecer pela firmeza dos preços locais dos grãos canéforas -- conhecidos como conilon ou robusta e naturalmente mais amargos que o arábica -- em meio à sustentação do mercado global da variedade, que atingiu um nível recorde em junho devido a uma oferta apertada em países como Vietnã e Indonésia.

A conjuntura também considera dados do governo brasileiro de uma safra maior de arábica no Brasil, segundo consumidor global de café, enquanto a colheita de canéforas será menor no país.

O consumo de grãos arábicas no Brasil poderia dobrar em 2023/24 para 6,6 milhões de sacas de 60 kg ante o ciclo anterior, enquanto a demanda da indústria por canéforas cairia de 18,7 milhões de sacas em 22/23 para 15,5 milhões de sacas na temporada atual, na visão da empresa de consultoria e gestão de riscos hEDGEpoint Global Markets.

"É o dobro, mas ainda estamos vendo um 'mix' muito abaixo da média (histórica para o arábica)", disse a analista de café da hEDGEpoint, Natália Gandolphi, à Reuters.

Ela lembrou que no passado a proporção de arábica e robusta/conilon na produção de café torrado e moído do Brasil era de 50% para cada variedade.

"Nos últimos dois anos teve esta queda (no uso de arábica), estamos vendo pequena recuperação, mas ainda não vemos uma situação normal", comentou a especialista, acreditando que a adição de arábica no "blend" deve se intensificar mais adiante na safra.

A expectativa de maior demanda por grãos arábica ocorre em um ano em que a colheita de café dessa variedade do Brasil vai crescer quase 16%, para 37,9 milhões de sacas de 60 kg, segundo os últimos números da estatal Conab. De outro lado, a produção de canéforas vai cair 7,6%, para 16,8 milhões de toneladas, conforme órgão do governo brasileiro.

Na véspera, o Departamento de Agricultura dos EUA (USDA, na sigla em inglês) apontou um aumento da produção global de café, citando uma expectativa de safra maior de arábica, notadamente do Brasil, e menor de robusta.

Gil Barabach, especialista da consultoria Safras & Mercado, concorda que a indústria brasileira poderá elevar o percentual de arábica no "blend".

"Especialmente se começar a aparecer mais arábica de bebida mais fraca e com preço relativamente mais baixo... E é essa a expectativa com inverno mais chuvoso", disse o consultor, em referência a eventuais problemas de qualidade para o grão que as chuvas podem trazer durante a colheita.

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Procurada, a Associação Brasileira da Indústria de Café (Abic) não comentou o assunto.

Um índice de suprimento de café, elaborado pela Abic, mostrou que a oferta de café arábica havia melhorado no Brasil, subindo do patamar de 6 (de suprimento mais seletivo) em março para algo mais próximo de 7 (de normalidade) no começo de junho.

Já o indicador para o conilon caiu de aproximadamente 7 para 6,28 no mesmo período, o menor nível em cerca de um ano, pelo menos. Abaixo de 7 a oferta é considerada "seletiva", em momento em que produtores estavam reticentes em vender, apesar do início da colheita.

Segundo informações da hEDGEpoint, atualmente o "spread" entre os preços de um arábica com maior incidência de defeitos e o conilon tipo 7 está mais próximo de 200 reais a saca, versus cerca de 500 reais a saca um ano antes.

Mais adocicados e suaves, os grãos arábicas geralmente têm um prêmio em relação aos canéforas, que são usados no "blend" e também pela indústria de café solúvel.

Mas esse diferencial se estreitou, algo que o mercado vai acompanhar, especialmente após o café arábica negociado na bolsa ICE ter atingido o menor patamar em cerca de seis meses nesta sexta-feira, com pressão do avanço da colheita no Brasil.

h2 Exportação/h2

Apesar da redução esperada no uso de robusta e conilon no "blend", a analista da hEDGEpoint não vê grande aumento no excedente para exportação no Brasil, uma vez que a safra do Espírito Santo, maior produtor dessa variedade, "é menor".