Reuters
Publicado 19.11.2021 11:33
Por Lisandra Paraguassu
BRASÍLIA (Reuters) - A cena do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva sendo recebido com honras pelo presidente da França, Emmanuel Macron, correu o Brasil e foi o ponto alto de uma viagem programada para causar exatamente o efeito que teve: lembrar ao eleitor brasileiro o bom trânsito que o ex-presidente teve e continua tendo no exterior.
Lula volta no sábado ao Brasil depois de uma semana de viagem a Europa em que, além de Macron, encontrou o provável próximo chanceler alemão, Olaf Scholz, o chefe de governo da Espanha, Pedro Sánchez, foi recebido e aplaudido no Parlamento Europeu, almoçou com a prefeita de Paris, Anne Hidalgo, participou de debates e seminários e recebeu um prêmio, o "Coragem Política", concedido pela revista francesa Política Internacional.
Uma das principais publicações do mundo na área, a Política Internacional tem 40 anos e, nesse período, só concedeu esse prêmio quatro vezes. Na plateia do ex-presidente estavam Nicolas Sarkozy, ex-presidente francês contemporâneo de Lula presidente, e François Hollande.
O encontro do ex-presidente com Macron, segundo o porta-voz do governo francês, Gabriel Attal, tratou de temas considerados "absolutamente essenciais": a economia depois da Covid-19 , o desmatamento, questões ambientais e climáticas --assuntos que levaram praticamente a uma crise diplomática entre Macron e o governo do presidente Jair Bolsonaro.
O encontro, previsto para ser de meia hora, durou mais de uma e, de acordo com o porta-voz, Macron considerou "pertinente" conversar com Lula sobre esses temas. Na mídia francesa, o péssimo relacionamento de Macron com Bolsonaro e o tratamento a Lula, considerado de "chefe de Estado em exercício", foi destacado.
Na Espanha, nesta sexta, o encontro com Lula foi destacado no Twitter por Pedro Sánchez. Os assuntos, segundo ele, foram aqueles que poderiam ser conversados com um presidente em exercício: a pandemia, a recuperação econômica, as mudanças climáticas.
Em um momento em que o Brasil se vê acuado com a pressão internacional sobre o aumento do desmatamento da Amazônia --essa semana, a Comissão Europeia propôs banir a importação de soja e carne sob risco de ligação com problemas ambientais-- o tema esteve no centro das conversas de Lula na Europa. Assim como os riscos dos avanços da extrema-direita pelo mundo.
Em entrevista em Paris, Lula negou que esteja buscando apoio internacional para sua candidatura à Presidência em 2022, mas deixou claro que sua intenção é recuperar a confiança no Brasil.
"Estou viajando para dizer ao mundo que o que o Brasil tem de melhor é o povo brasileiro. O Brasil não se resume ao atual governante. O Brasil é infinitamente melhor do que o atual governo", disse. "Essa é a razão da minha viagem, recuperar a confiança no Brasil."
Não faltaram críticas de Lula ao atual governo, mas o nome de Bolsonaro praticamente não foi citado. Em entrevistas, discursos e conversas com membros da centro-esquerda, Lula se concentrou em tentar mostrar que o Brasil pode voltar a assumir uma liderança mundial --de preferência, com ele à frente.
Contemporâneo do ex-presidente, o ex-primeiro-ministro espanhol José Luiz Zapatero, do Partido Socialista Operário Espanhol, resumiu:
"Estaremos a seu lado para que se produza isso que se necessita em seu país e na Ibero-América, que é Lula presidente do Brasil novamente", disse em um discurso em um debate sobre desenvolvimento que Lula participou na quinta na Espanha.
Para o consultor político e CEO da Dharma Politics, Creomar de Souza, é importante levar em consideração o fato de que até agora todas as ações, falas e ocupações de espaços feitas por Lula têm sido muito bem medidas.
"A ideia de produzir falas em ambientes controlados tem sido a tônica deste movimento ou momento de pré-campanha, e seguindo esta lógica, o tour europeu também se encaixa neste premissa", disse Creomar à Reuters.
"Agora, diante de um cenário em que propositalmente o presidente Bolsonaro criou atritos com algumas contrapartes europeias, não deixa de ser também um diagnóstico de algumas das fissuras que foram construídas nos últimos anos e também de quão trabalhoso tenderá a ser, para qualquer político empossado na Presidência, o processo de reconstrução de uma imagem internacional normal a partir de janeiro de 2023", acrescentou.
h2 COMPARAÇÕES/h2Coincidência ou não, na mesma semana em que Lula estava na Europa, Bolsonaro passou oito dias no Oriente Médio. Ao saber da comparação que estava sendo feita entre suas viagens e as de Lula, o presidente ficou claramente incomodado.
"Eu vi na Globo News: 'Bolsonaro decepciona, Lula é um sucesso'. Ah, pelo amor de Deus", disse aos jornalistas que acompanhavam sua viagem.
A comparação, no entanto, é inevitável. Há algumas semanas, durante a reunião do G20, em Roma, Bolsonaro ficou visivelmente isolado. Apesar dos esforços do Itamaraty, o governo brasileiro não conseguiu marcar reuniões bilaterais com nenhum dos demais chefes de Estado que estavam no encontro. A única agenda foi com o presidente da Itália, Sérgio Matarella, que, pelas regras diplomáticas, era obrigado a receber todos os presidentes da cúpula.
De acordo com uma fonte, o governo brasileiro ainda tentou encaixar visitas oficiais a outros países europeus depois do G20, mas sem sucesso. A vasta maioria dos líderes da região foi para a reunião da COP26, em Glasgow, a qual Bolsonaro se recusou a comparecer para não ouvir críticas a sua política ambiental.
A agenda de nenhum ou poucos encontros bilaterais em fóruns internacionais têm sido a tônica das viagens do presidente, especialmente depois da derrota de Donald Trump, nos Estados Unidos.
Em Nova York, em setembro, durante a Assembleia-Geral das Nações Unidas --quando os chefes de Estado costumam rechear suas agendas com conversas-- Bolsonaro teve um diálogo com o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, um encontro protocolocar com o secretário-geral da ONU, António Guterres, e uma segunda bilateral com o presidente da Polônia, Andrezej Duda, também de extrema-direita e um dos poucos aliados europeus do presidente brasileiro.
Escrito por: Reuters
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