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Vendo Monza 2.0, Azul-Marinho, Única Dona

Publicado 26.01.2021, 14:01
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Minha mãe tinha um Monza 2.0, azul-marinho. Ela amava. Gostava tanto que ficou com o carro por três anos. Depois, trocou… por outro Monza 2.0, azul-marinho. 

Daí se passaram mais alguns anos e ela comprou um Vectra, que era melhor, basicamente uma evolução frente ao carro anterior.

Nada contra o Monza. Ao contrário. Ele foi muito legal por um tempo. Cumpriu seu papel. Guardo ótimas lembranças. Mas passou. Foi bom por alguns anos, revolucionou o mercado — até que deixou de ser. Era descolado ter um Monza quando ele chegou ao Brasil. Mas seria ridículo ter um Monza ainda hoje. E tudo bem. O Monza continua com sua marca na história do mercado automobilístico brasileiro.

As coisas são assim mesmo. Elas chegam, promovem uma novidade; às vezes, uma disrupção, até uma revolução. Então, elas mesmas passam, são superadas por outras. Com o perdão do neologismo, o disruptor hoje é o disruptado amanhã.

Nada muito diferente da destruição criativa de Schumpeter, tão conhecida na economia — e, para mim, as finanças e os investimentos são parte da economia.  

Na arte, funciona parecido também. Na peça "Vermelho'', por exemplo, Mark Rothko demonstra sua rivalidade com Jackson Pollock e fúria contra a dificuldade dos cubistas e surrealistas em admitir sua superação pelo expressionismo abstrato. Alguns anos mais tarde, é o próprio Rothko quem não admite a disrupção promovida por Andy Warhol e sua pop arte.

Até mesmo nos relacionamentos pode ser assim. Depois de vários anos, a coisa, se terminar, não quer dizer que "não deu certo”. Foi ótimo. Deu certo por duas décadas. E depois não deu mais. Maravilha. Segue em frente, com orgulho do vivido no passado.

Me deixe voltar algumas casas. 

Aos poucos familiarizados, o termo “indústria 1.0” se refere ao mercado de capitais dominado pelos bancos e suas plataformas fechadas. Com seus gerentes, metas a bater, PICs, títulos de capitalização, CDBs e outras coisas muitas vezes bem tóxicas; o Itaú (SA:ITUB4) só oferecia produtos do Itaú. Nada contra o banco, de quem sempre fui correntista. O Bradesco (SA:BBDC4) também só oferecia produtos do Bradesco. A banda tocava dessa forma, independentemente da bandeira.

O investidor estava numa situação ruim, com poucas opções (ele só podia comprar investimentos do respectivo banco), e condenado a um enorme conflito de interesses (a instituição X só oferecia seus próprios produtos, ainda que o banco Y tivesse produtos melhores).

Então, veio a indústria 2.0, muito melhor do que a anterior. Com muitos méritos, as plataformas de investimento chamadas independentes, inspiradas sobretudo no modelo da Charles Schwab, trouxeram ao Brasil o conceito da plataforma aberta. Ou seja, passaram a oferecer produtos de terceiros; não apenas os seus próprios.  

Foi ótimo para o investidor. Agora, ele poderia escolher entre mais opções e pegar a melhor para si. Além disso, estaria sob menor conflito de interesses, porque a plataforma de investimento poderia oferecer coisas de outras casas, potencialmente melhores do que a sua própria.

O que faltou? Embora seja uma evolução enorme frente à indústria 1.0, um marco na história do mercado de capitais brasileiro, o modelo 2.0 deixou muitos problemas por resolver. Vejo três principais: 

— O conflito de interesses: a forma de remuneração dos assessores dessas plataformas de investimento é muito semelhante à do gerente do banco. Nada mudou nesse sentido. A essência é a mesma. Ambos são distribuidores de produtos. Ou seja, vendedores, remunerados conforme a venda e suas comissões. Se você vende o produto A, ganha mais do que se vende o produto B. Portanto, há um incentivo monetário para o assessor de investimento, que é um vendedor, distribuir mais o produto A do que B. Esclarecimento importante: o problema não é do assessor. Ele tem bocas a alimentar, boletos pra pagar. Todos nós estaríamos sob o mesmo dilema. A fragilidade do modelo está na estrutura de incentivos. Menos personalismo, mais instituições — como carecemos disso…

— Falta de conhecimento técnico: se você vai a um médico, será atendido por um especialista em medicina. Um nutricionista, a mesma coisa. Se você fosse se consultar com um vendedor de remédios, possivelmente o número e a frequência das drogas prescritas seriam outros. Um vendedor está treinado na venda; ele não é um técnico, um especialista, um estudioso do mercado. Não é melhor, nem pior. É apenas uma outra atividade. Vá a uma loja de shopping e pergunte ao vendedor se a camisa que você acaba de provar ficou boa. O que você acha que ele vai responder? Se você é atendido por um vendedor em vez de um técnico, estará em desvantagem técnica. É uma construção lógica.

— Um modelo caro: não houve real desintermediação no modelo 2.0. Os heróis contam e se contam cada história. Ainda há um intermediário entre a instituição financeira e o investidor — no caso, o agente autônomo ou assessor de investimento. Se a plataforma de investimento precisa remunerar a si e ao agente autônomo, ela vai incorrer num custo maior. Resultado: vai ter margem menor, porque divide o bolo com o assessor; ou vai ter que cobrar mais caro, repassando o custo da intermediação para o cliente. Não é à toa que o cashback e a corretagem zero estão somente em plataformas sem agente autônomo. Essas coisas não convivem bem. Como a corretora vai dar cashback e dividir seu rebate consigo, com o agente autônomo e com o cliente? Vai sobrar quase nada pra ninguém… 

Aí entra o modelo 3.0, que supera o anterior e resolve as questões acima, sendo uma evolução natural das coisas. Você retira o agente autônomo da história. Fornece research ou consultoria ao investidor. Assim, ele passa a ser orientado por um técnico (não por um vendedor). Além disso, como se trata de um modelo muito mais escalável do que os analógicos agentes autônomos, pode ser cobrado muito menos do cliente, o que se materializa por taxas menores, cashback, transparência, alinhamento e corretagem zero. Fica mais barato para o investidor, cujo retorno líquido final fica maior. Por fim, como não se recebe diferente do ativo A ou B, mitiga-se também o conflito de interesses. Não importa se o investidor coloca seu dinheiro no fundo X ou Y, a plataforma fica com o mesmo em cada um deles, no batizado “cashback sem conflito”.

Do mesmo jeito que a indústria 2.0 retirou (e ainda retira) muito dinheiro dos bancões, me parece inexorável imaginar sua superação pelo modelo 3.0. A razão é muito simples: o 3.0 é muito melhor e as plataformas anteriores, pela sua estrutura, não vão conseguir competir. Seus produtos necessariamente serão mais caros e piores. É da natureza da coisa. 

A verdade é que a década iniciada em 2010 já terminou também para os investimentos. Espero que você tenha percebido. 

Estou vendendo aquele Monza 2.0, azul-marinho, única dona, toca-fitas bacana, conservadão. Tem interesse? 

 

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