O Ibovespa não conseguiu sustentar o sinal positivo pelo terceiro dia, nem a linha dos 108 mil pela quarta sessão, nível que tem predominado na B3 (BVMF:B3SA3) desde o último dia 3, após o índice ter iniciado o mês em tendência negativa, saindo dos 113,4 mil pontos no fim de janeiro. Em fevereiro, o Ibovespa acumula agora perda de 4,92% ao encerrar esta terça-feira em baixa de 0,91%, aos 107.848,81 pontos, tocando na mínima da sessão os 107.557,07 (-1,18%), no fim da tarde, com máxima a 109.564,11 pela manhã e abertura aos 108.838,52 pontos.
O giro financeiro se manteve moderado nesta terça-feira, a R$ 24,1 bilhões. Na semana, o Ibovespa acumula agora perda de 0,21%, cedendo até aqui 1,72% em 2023.
O humor em Nova York piorou ainda pela manhã, com a leitura mista sobre a inflação ao consumidor nos Estados Unidos em janeiro, reduzindo o apetite por risco em momento no qual os investidores ainda mantêm dúvidas quanto ao nível da taxa terminal de juros do Federal Reserve - premido entre tom mais suave, recentemente, para a política monetária e dados americanos, especialmente sobre o mercado de trabalho, que ainda sugerem cautela.
Aqui, o dólar virou ainda no começo da tarde, passando a subir, enquanto os DIs para janeiro de 2025 e 2027 seguiam em baixa em relação ao ajuste anterior, com a percepção favorável do mercado sobre a participação do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, na noite anterior no Roda Viva, da TV Cultura.
Mas, em desdobramento negativo à tarde, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva já teria avisado à equipe econômica que quer aumento de um ponto porcentual na meta de inflação de 2023, atualmente em 3,25%. Lula avalia que com meta maior seria possível reduzir os juros para patamar próximo de 12% no fim do ano, com cortes consecutivos de 0,25 e 0,50 ponto porcentual, afirmaram técnicos do Ministério da Fazenda ao Broadcast, conforme relato do jornalista Antonio Temóteo, de Brasília. As projeções do Focus apontam para uma Selic ao final deste ano a 12,75%.
"O mercado, aqui, continua a ser pressionado principalmente por questões locais, como o BC, a taxa de juros e a meta de inflação. Viramos o dia com a entrevista do Campos Neto, em que estendeu a mão para o governo, e se imaginava que haveria uma continuidade. Antes mesmo da abertura do mercado, ele reafirmou hoje, em evento do BTG Pactual (BVMF:BPAC11), tudo que havia dito na noite de ontem, no Roda Viva. Entretanto, a pressão do governo sobre o Banco Central não amenizou", observa Eduardo Cavalheiro, gestor da Rio Verde Investimentos.
Ele se refere também a declarações da presidente do PT, Gleisi Hoffmann, bem como ao relato de que o presidente Lula teria exigido do ministro Fernando Haddad (Fazenda) que, em reunião do Conselho Monetário Nacional (CMN), determine aumento da meta de inflação de 3,25% para 4,25% este ano, "o que foi muito mal recebido pelo mercado, que virou, com Bolsa pra baixo e dólar pra cima". O CMN volta a se reunir nesta quinta-feira.
Perto do fechamento, contudo, relato de que Lula ainda não teria batido o martelo quanto a uma mudança na meta de inflação contribuiu para tirar parte da pressão sobre o Ibovespa, que chegou a recuperar, pontualmente, o nível dos 108 mil pontos. Com a Bolsa nos ajustes finais, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que mudança na meta de inflação não estará na pauta do CMN desta quinta-feira.
Ainda assim, "o governo não parece disposto a acordo, apesar de o BC ter estendido a mão. Aumento na meta de inflação é ruim do ponto de vista técnico, mexe com o mercado e exacerba uma certa crise de confiança na condução da política monetária", aponta Cavalheiro, da Rio Verde. "A tentativa do mercado de ficar mais tranquilo se foi", acrescenta o gestor, referindo-se ao humor favorável do começo do dia.
Ontem à noite, na contramão da pressão do governo, Campos Neto fez referências que o mercado gosta de ouvir: a Selic é um componente importante, mas não definidor por si da curva de juros a termo; e elevar, ainda que pouco, as metas de inflação pode afetar a credibilidade da política monetária, aprofundando a desancoragem das expectativas e levando os juros de mercado mais para cima, em vez de fazê-los ceder como o governo gostaria.
A clareza conceitual se fez acompanhar de sinais pacificadores em direção a críticos, no governo e em partidos como PT e PSOL, que têm atacado a Selic a 13,75% ao ano, bem como o regime de metas de inflação, considerado inexequível nos patamares que haviam sido definidos pelo Conselho Monetário Nacional - e que Campos Neto deixou claro, ontem à noite no Roda Viva, que não gostaria de mudar, agora ou adiante, ainda que esteja aberto à discussão, inclusive com o Congresso.
Em alguns momentos da entrevista, o presidente do BC observou que, até as metas terem sido colocadas em dúvida, a discussão dos agentes econômicos e do mercado era sobre quando a Selic começaria a ser cortada, possivelmente em junho, na metade do ano, mas o questionamento do regime acabou produzindo o efeito oposto, ao pressionar a curva de juros.
Além do contexto macroeconômico em interação com o político, o mercado segue atento à temporada de resultados corporativos, e o destaque desta terça-feira foram os números do Banco do Brasil (BVMF:BBAS3), que vieram acima do esperado para o quarto trimestre, colocando BB ON em alta de 2,34% no encerramento da sessão - moderado em relação ao ganho de cerca de 4% visto até o meio da tarde, quando a Bolsa piorou.
"O Banco do Brasil entregou RoE (retorno sobre o patrimônio) de 23% no trimestre, acima do que o mercado esperava", diz Paulo Luives, especialista da Valor Investimentos, destacando também a entrevista de Campos Neto, "que busca aproximação com o governo, mas alerta que a mudança da meta de inflação pode gerar efeito oposto (ao pretendido), no mercado".
Apesar da satisfação com os resultados do BB, o dia na B3 foi majoritariamente negativo para ações de grandes bancos, como Itaú (BVMF:ITUB4) (PN -1,24%) e Santander Brasil (BVMF:SANB11) (Unit -0,31%). O setor de commodities, que ao lado do financeiro costuma dar direção ao Ibovespa, pelo peso conjunto sobre o índice, também foi mal na sessão, à exceção de Vale (BVMF:VALE3) (ON +0,45%) e de parte das siderúrgicas (Gerdau (BVMF:GGBR4) PN +0,24%, CSN ON (BVMF:CSNA3) +0,29%), que também acomodaram ganhos em direção ao fim da tarde, com a deterioração de expectativas sobre a política monetária.
Na ponta do Ibovespa, além de Banco do Brasil, destaque nesta terça-feira para Carrefour (BVMF:CRFB3) Brasil (+2,92%), à frente também de Sabesp (BVMF:SBSP3) (+1,87%) e TIM (BVMF:TIMS3) (+1,56%). No lado oposto, Raizen (BVMF:RAIZ4)(-7,45%), Méliuz (BVMF:CASH3) (-7,45% também), CVC (BVMF:CVCB3) (-6,72%), BRF (BVMF:BRFS3) (-6,51%) e Yduqs (BVMF:YDUQ3) (-6,41%).